1Para
Saskia Sassen (2010), a globalização foi responsável pela
desestabilização das antigas hierarquias de escala, antes quase que
integralmente centradas no nível nacional, referenciado na figura do
Estado nacional. A proliferação das empresas multinacionais com suas
formas de organização – redes de filiais espraiadas pelo globo ao passo
que funções estratégicas se concentram em um único lugar (ou, no máximo,
em alguns poucos lugares) – contribuíram para o aumento da complexidade
da configuração multiescalar do mundo.
2Esse
parece ser o caso na Eurometrópole Lille-Kortrijk-Tournai (ELKT),
formada em 2008, uma metrópole transfronteiriça que congrega 147
municipalidades de França e Bélgica. Centrada na francesa Lille, essa
Eurometrópole nasce como uma alternativa de desenvolvimento econômico
para uma região de passado minerador e industrial e em grande
dificuldade socioeconômica a partir do declínio dessas atividades na
região, iniciado nos anos de 1960.
3No
entanto, esse projeto esbarra em algumas dificuldades: apesar da
crescente dissolução das fronteiras nacionais na Europa, trata-se aqui
de um projeto que envolve dois países, três regiões subnacionais e duas
línguas oficiais. Ou seja, estamos falando de distintas heranças
culturais, formações nacionais e identidades regionais. Quais as
especificidades e dificuldades que um projeto dessa natureza encerra? É
possível falarmos de uma possível dificuldade envolvendo identidades
regionais em pleno 2016, quando a globalização “homogeneizadora”
continua avançando?
4Para
compreendermos os pormenores desse processo e respondermos as questões
colocadas, faz-se necessário uma volta ao passado da formação nacional
de França e Bélgica, bem como a compreensão do papel de suas regiões
subnacionais nesse processo de estabelecimento das nações.
- 1 O GECT é um instrumento que tem por vocação responder às dificuldades encontradas nos domínios da c (...)
5A
Eurometrópole Lille-Kortrijk-Tournai (ELKT) é uma área metropolitana
binacional centrada nas cidades francesa de Lille e nas belgas Kortrijk e
Tournai que nasce, oficial e institucionalmente, em 2008. Ela cobre as
regiões da Metrópole Europeia de Lille (MEL), a província de
West-Vlaanderen/Flandres (região de predomínio do holandês como língua
oficial) e a região oeste da Valônia (Wallonie Picarde, onde predomina o
francês como língua) (Figura 1). São 147 municipalidades no total que
em 2008 contavam, em conjunto, com 2.155.161 habitantes. A ELKT é
considerada um Groupement européen de coopération territoriale (GECT), um dispositivo de cooperação coordenado pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu a partir de julho de 2006.1
Figura 1: Mapa da Eurometrópole Lille-Kortrijk-Tournai: cidades principais, fronteiras nacionais e fronteiras linguísticas
Fonte: Durand, Frédéric (2015)
- 2 Trecho retirado do site da ELKT (fr.eurometropolis.eu) e traduzido livremente pelo autor. Acesso em (...)
6O
principal motivo para a criação da ELKT é facilitar as condições de vida
cotidiana para a população da região e também as condições de operação
das empresas que atuam ali. As principais preocupações são facilitar os
deslocamentos diários e melhorar as condições para quem quer trabalhar,
estudar, visitar, ter momentos de lazer, etc. A Eurometrópole é “(...)
um reservatório de soluções concretas para facilitar a vida cotidiana de
2,1 milhões de habitantes e de numerosos atores locais: empresas,
associações, artistas, organizações diversas”.2
- 3 Nesse plano estratégico estão inclusas uma série de medidas que visam a acelerar a integração dos t (...)
7Desde
sua fundação, os trabalhos visando a integração se intensificaram e
metas continuam sendo traçadas para que a cooperação traga cada vez mais
frutos para as municipalidades envolvidas na ELKT. Desde 2014, por
exemplo, está em curso um projeto coletivo que visa a alcançar
resultados concretos já no ano de 2020: La Stratégie Eurométropole 2020.3
8Porém,
esse projeto de desenvolvimento comum esbarra em algumas limitações de
ordem histórica e cultural: trata-se da tentativa de unir dois países e
três regiões subnacionais onde duas línguas oficiais são faladas (o
francês e o holandês). Além disso, o histórico de formação nacional de
ambos os países é totalmente diferente, o que inevitavelmente traz
diversas especificidades a todo o processo de conformação dessa
metrópole transfronteiriça. Por isso se faz importante compreendermos a
formação nacional tanto de França e Bélgica e a identidade que se
conforma a partir desses processos, para entendermos melhor e com maior
profundidade o contexto que envolve um projeto transnacional dessa
envergadura.
9A
Europa possui uma história imemorial de migrações e mistura entre povos.
Não é nosso objetivo aqui resgatar toda a herança étnica francesa ou
belga: essa seria uma tarefa exaustiva, inglória e inócua. Interessa-nos
mais traçar um panorama da formação nacional de ambos os países: como
se deram e por quais bases e mecanismos se sustentaram e se sustentam
suas identidades e sentimentos de pertencimento?
10Esse
é um esforço que se faz importante uma vez que são justamente essas
bases que servirão a discursos que terão por intuito manter coeso um
estado nacional ao longo do tempo; são determinados traços culturais, um
clamor pela paisagem “única” de um país ou região, as qualidades
superiores do povo que a constitui (Thièsse, 1997)... É desse
dispositivo discursivo que um país constrói e transmite – a partir de
sua classe dirigente (em geral composta de homens brancos, pertencentes a
uma elite econômica) – a seu povo valores supostamente comuns à
totalidade da população (Löfgren, 1991).
11O
intuito desse tipo de projeto é “consolidar” uma identidade cultural
nacional com a qual todos os habitantes possam se relacionar; mais do
que isso: possam se sentir pertencentes. Portanto, sendo criada a partir
de produtos culturais, essa “condição nacional” estará aberta a todo
tipo de apropriação ideológica e política (Anderson, 2015), assumindo
grande poder social de referência e aglutinação.
12Com
a mudança cultural dos países ao longo dos séculos, mudam-se também os
produtos culturais apropriados pelos discursos de identidade nacional.
Assim, o processo de criação dessa identidade – de uma condição nacional
– é também mutável, em constante adaptação, e sempre pretende se
ajustar as referências culturais que se transformam, com a inserção de
novas práticas e olhares e o esquecimento de outras, em sintonia por
exemplo com as possibilidades dos meios de comunicação e divulgação de
novos hábitos, manifestações.
13O
panorama a partir da década de 1970, no entanto, é especialmente
complexo pela crescente globalização e a aniquilação do espaço pelo
tempo cada vez maior: observa-se, de certa forma, um impulso de
homogeneização cultural a partir do consumo de bens que são basicamente
os mesmos em todo o mundo Ocidental (Hall, 2015). Consomem-se estilos de
se vestir, estilos de vida, padrões estéticos, gostos musicais etc. que
respondem a uma diretriz cultural pautada por aqueles países com maior
influência financeira no mundo, manifestamente os Estados Unidos e o
Reino Unido. Soma-se a isso o movimento de grandes migrações
pós-coloniais, onde os países antes considerados “metrópoles” passaram a
receber um grande afluxo de populações vindas de suas antigas
“colônias”. Tal processo contribui para uma diversificação cultural e
étnica no centro da sociedade ocidental, dita “moderna”, que leva a um
deslocamento das bases culturais que serviam de referência para a
estruturação da identidade nacional “clássica” daquele país.
14Aqui
vamos recuperar de forma breve como se deu a formação nacional – e por
conseguinte, da identidade nacional – da França, destacando o processo
em Nord-Pas de Calais; a partir daí iremos estudar como foi a fundação
da Bélgica e a relação conflitante entre as regiões de Flandres e
Valônia. Na sequência analisaremos o nacionalismo, abordando a forma
como ele é construído – ou “imaginado”, nas palavras de Anderson (2015) –
tendo em conta tradições muitas vezes “inventadas” (Hobsbawm &
Ranger, 1984).
15O
clássico ensaio “O que é uma nação?” do filósofo francês Ernest Renan,
de 1882, esclarece como se deu a formação étnica de vários países
europeus. Ele igualmente postula que qualquer nação do continente é,
invariavelmente, produto de uma mistura entre povos e, portanto, não
existe uma nação de “raça pura”. Assim é também o caso da França, cujo
nome, curiosamente, é originário dos povos Francos, etnia da qual uma
“virtualmente imperceptível minoria” (Renan, 1995 [1882]: 10) dos
franceses era descendente. Dentre outros povos que formaram a França,
cita Renan, estão os normandos, os celtas, os escandinavos, os
germânicos e outros.
16A
definição do que era a “nação francesa” permaneceu relativamente
inconsistente ao longo dos séculos até a fundação da Terceira República,
que durou de 1871 até 1940. A queda do imperador Napoleão III, em 1870,
derrotado pelas tropas alemãs, afetou profundamente a moral do país e
provocou reflexões concernentes a qual era a verdadeira posição da
França no cenário europeu. A suposta supremacia militar, econômica e
cultural do país tinha se tornado algo ilusório: de acordo com
Anne-Marie Thièsse (1997: 3), “a França, após 1870, não é mais percebida
por seus dirigentes como a nação mais potente, a mais avançada”.
17Contra
todos esses fatos que se abatiam sobre a recém-criada República, as
elites dão início a um projeto cujo intuito era mostrar a França de uma
maneira mais modesta, estabelecendo a excelência do país não pela
superioridade bélica ou a proeza cultural, mas sim pela acumulação
harmoniosa de todos os elementos necessários à felicidade humana
(Thièsse, 1995, 1997). É a mistura de climas, de recursos naturais, a
gama variada de paisagens que constituem o verdadeiro tesouro da França.
Assim, Thièsse explica, que “(...) servir a pátria é, antes de mais
nada, conhecer, fazer conhecer e cultivar a maravilhosa diversidade do
território nacional” (1997: 3-4). E é justamente essa diversidade que
será a base do discurso fundador da nação francesa. Soa paradoxal, mas é
pela valorização da diversidade da natureza e das paisagens que o
discurso unificador nacional francês foi construído.
18Esse
discurso parte do pressuposto de que a França tem uma “vocação
universal” expressa pela variedade natural que encerra dentro de suas
fronteiras, tornando-a um “resumo ideal de todos os países europeus”
(Thièsse, 1997: 5). A França seria, assim, predestinada a encerrar
também em si todos os valores universais. O fim ideológico desse tipo de
postulado era o de desarmar os conflitos internos, intrarregionais,
elevando essa imagem privilegiada do país no cenário internacional em
meio as outras nações. Contribuiu para solidificar tal argumento o fato
de que apesar do país ser composto por várias regiões, nunca os
movimentos separatistas – como aqueles na Córsega e em Flandres, nos
anos de 1930 – terem tido efeito expressivo (Thièsse, 1995).
19No
entanto, a ideia do consenso – da França diversa, porém unida – apelava
basicamente às imagens naturais. Estava nas diferenças sociais e
políticas o ponto frágil desse discurso consensual. A contraposição
clara entre Paris – o centro econômico e do poder – e a province
(a “província”) – todo o demais interior do país – deveria ser
solapado, senão factualmente, pelo menos ao nível do discurso. É
justamente a vontade de corrigir essa centralização excessiva o “grau
zero do consenso nacional (...) desde que não esteja em discussão as
modalidades concretas de descentralização” (Thièsse, 1995: 5). Era
imprescindível a manutenção da identidade.
20Movimentos
regionalistas passaram a surgir para promover os valores, as belezas e
as culturas locais por meio de exposições, conferências, audições,
representações etc. Era preciso dar a conhecer as singularidades e ao
mesmo tempo reforçá-las para dentro e fora das diversas regiões que
compunham a França. Em material impresso de 1906 de um desses
movimentos, o Renascimento Provincial, é possível ler:
Esperamos os maiores benefícios
dessas manifestações da arte provincial, que tem suas origens nas
profundezas da raça e da história. Ao exaltar diante do povo o gênio
distintivo de cada uma de nossas províncias, acreditamos despertar as
energias locais, reconduzi-las à pureza do gosto francês e salvaguardar
assim a força e a beleza nacionais. (La Renaissance Provinciale apud
Thièsse, 1995: 7)
21O
regionalismo era, dessa maneira, promovido como o tema fulcral da
realização da união nacional. Ele era portador da capacidade de ao mesmo
tempo exaltar as diferenças e neutraliza-las, deslocando-as do plano
social para o plano geográfico.
O regionalismo, portanto,
desempenha na história francesa um papel de consolidação da identidade
nacional, relegado com frequência ao segundo plano, mas subitamente
colocado em evidência nos períodos de crise intensa. (Thièsse, 1995: 5)
22Outro
meio onde esse discurso regional/nacional foi amplamente divulgado foi o
escolar: o uso da educação formal para tais fins era uma das
estratégias mais abrangentes. Ele garantia um aprendizado em massa
bastante eficaz sobre o “sentimento patriótico” para as gerações
futuras. Uma das táticas mais bem-sucedidas na confecção de livros
escolares do período da Terceira República era a de ensinar ao aluno
quanto as características da região onde habitava e instigar-lhe o amor à
“pequena pátria” para, então em consequência passar à compreensão e ao
amor à “grande Pátria”:
O amor do cidadão pela pátria
deve ser, ao final do processo de crescimento e maturação, análogo
àquele da criança por sua família; a afeição à França é considerada como
a transposição da afeição do estudante ao seu solo natal. (Thièsse,
1997: 17)
23Ou então realçando a diversidade e os elos de ligação das partes com o todo, gerando cumplicidade, evocava-se:
A França é una e indivisível,
mas ela é composta de partes que têm sua unidade. Nós somos Franceses,
mas nós somos também Bretons, Normands, Picards, Flamands, Lorrains,
Bourguignons, Provençaux, Languedociens, Gascons. Nós temos todos uma
pequena pátria da qual amamos suas paisagens familiares, suas roupas
típicas, o sotaque, e da qual todos temos orgulho. Amar essa pequena
pátria, nada é mais legítimo, nada é mais natural, nada é mais próprio
para fortificar o amor à França, nossa pátria comum. (...) Cada uma de
nossas velhas províncias têm particularidades gloriosas, mas que
contribuem ao mesmo tempo à glória da França inteira. Estudemo-las para
termos ainda mais razões para ter afeição ao solo natal, para termos
maior noção do lugar e da importância do nosso país no conjunto do País.
(Langlois, 1891 apud Thièsse, 1997: 18)
24Em
suma, o amor e orgulho à “pequena pátria” eram resultantes de uma ode às
paisagens regionais, à geografia, à história local, aos “produtos da
terra”, aos homens ilustres e à um folclore (Thièsse, 1997: 34).
Buscava-se a partir de um conjunto de sentimentos elaborar uma
autodescrição das sínteses regional e nacional ao mesmo tempo singulares
e gerais.
25Percebemos,
a partir da origem do discurso nacional veiculado na França da Terceira
República, que o corpo identitário francês é baseado numa visão parcial
e elitista da realidade. Ela foi pensada pelos dirigentes políticos e
econômicos do país e ensinados por uma instituição estatal (como são a
maioria das escolas da França até os dias de hoje, públicas). Apesar
disso, essa “identidade nacional francesa” foi assimilada por membros de
grupos sociais que não compartilhavam da mesma realidade socioeconômica
daqueles que mais contribuíram para moldá-la.
26É o
caso dos trabalhadores industriais e dos estrangeiros, cita Thièsse
(1997: 6), que se confundem muitas vezes, posto que boa parte dos
imigrantes também chegam para trabalhar nas indústrias ou em empregos
urbanos: “o mundo proletário é aquele excluído com maior frequência do
discurso sobre a identidade nacional”. A integração dos imigrantes de
fato e de juízo nunca fez parte das representações identitárias, seja da
pequena ou da grande pátria.
27Num
manual escolar, editado em Lyon em 1932, por J.M. Rousset, o autor
proclama, repetidas vezes, o respeito pela “solidariedade humana
universal” praticado na França e apresenta – o que é raro para a época –
os trabalhadores industriais como componentes da identidade regional.
No entanto, Rousset destaca o valor dos proletários “tradicionais”, ou
seja, os franceses; e quando menciona os mineradores estrangeiros, adota
uma postura de xenofobia seletiva:
Apenas o cerne dos velhos
mineiros permanece fiel à mina que deve recrutar hoje seus trabalhadores
entre os estrangeiros. Se os poloneses são excelentes trabalhadores, os
argelinos e marroquinos, por outro lado, são medíocres fisicamente e
moralmente. (Rousset, 1932: 91 apud Thièsse, 1997: 91)
28A imigração também era fonte de preocupação para Pierrein e Guiral, autores do manual do departamento de Bouches-du-Rhône:
(...) mas estamos longe do
povoamento indígena provençal, inundados por esse afluxo de populações
vindas dos Alpes e da Córsega, de Argelinos, de Italianos e de Espanhóis
ou Armênios. Como reencontrar as características originais da nossa
raça dentro desse microcosmo mediterrâneo? (Pierrein & Guiral, 1945:
147-149 apud Thièsse, 1997: 92)
29Já
no Nord, departamento onde se localiza Lille e que tem uma história
econômica e social intrinsecamente ligada à mineração e à indústria,
Anne-Marie Thièsse (1997) aponta um corpo de imigrantes já mais
integrados à sociedade. Ela declara que apenas os manuais didáticos
dedicados ao Nord, antes e depois da Segunda Guerra Mundial, apontavam
os imigrantes como um aporte para a sociedade local.
30Outro
traço sui generis nos manuais dessa parte da França é que eles são os
únicos a representarem a atividade industrial como uma razão de orgulho.
Constantemente desdenhada pela falta de charme de suas paisagens e pelo
clima pouco amistoso, a herança industrial e mineradora era cultivada
com afeto pela população local. “O Nord” – diziam seus habitantes – “é o
departamento de província mais ativo, mais populoso, mais rico e aquele
que paga mais impostos” (Thièsse, 1997: 91). Um orgulho pautado na
valorização do trabalho, e um trabalho braçal que gerava frutos e não
deixava dúvidas quanto ao seu sucesso, sem fugir às responsabilidades do
Estado.
31Gérard-François
Dumont (1995), falando sobre a França, aponta que a conformação da
identidade regional passa pela valorização de pelo menos uma “cultura
regional”, um conjunto de traços distintos espirituais e materiais,
intelectuais e afetivos que caracterizam a região tendo em conta que “a
cultura engloba não só as artes e a literatura, mas também os modos de
vida, os direitos fundamentais do ser humano, os sistemas de valor, as
tradições e as crenças” (Dumont, 1995: 8).
32Como
efeito direto desse movimento em favor da valorização cultural como
força de unificação regional, observou-se uma tendência geral dos
conselhos regionais franceses de promover atividades ligadas ao
patrimônio: dar visibilidade aos locais eleitos como representativos,
diretamente ou por intermédio de obras de ficção, encorajar publicações
regionais e o uso das línguas (dialetos) locais, por exemplo. A promoção
da imagem regional é, nesses parâmetros, uma tática que contribui para a
difusão dos aspectos culturais peculiares visando diferencia-los em
relação ao entorno.
- 4 O conceito de Trame Verte et Bleue foi implantado no Nord-Pas de Calais em 2009. No entanto, ele é (...)
33No
Nord-Pas de Calais uma série de medidas foi tomada nesse sentido de
valorização do passado cultural regional como mecanismo de reforço de
uma identidade comum: a fundação do Parc Naturel Transfrontalier du
Hainaut (Parque Natural Transfronteiriço do Hainaut), criado em 1996 e
voltado a valorizar a diversidade natural da região; a escolha de Lille
como uma das capitais europeias da cultura de 2004; a Trame Verte et Bleue (Trama Verde e Azul),4
dispositivo de proteção ambiental, tanto da flora e fauna, quanto dos
recursos hídricos, instalado na região em 2009; e a inclusão da Bassin Minier du Nord-Pas de Calais (Bacia Mineradora do Nord-Pas de Calais) como paisagem cultural tombada pela UNESCO em 2012 (Siffert, 2016).
34Se
em países como a França (um exemplo de formação de um Estado-nação),
como acabamos de mostrar, as questões em torno da identidade já suscitam
debates, o que dizer da realidade de países de formação mais recente,
como a Bélgica? E nesse caso, ainda contribui para o aumento da
complexidade o fato de o país ter sido criado a partir da aglomeração de
identidades étnico-territoriais distintas e com pesos políticos
desequilibrados: sempre se observaram tensões entre o “centro”
francófono e a “periferia” flamenga.
35Na
Bélgica, especialmente nas últimas duas décadas, setores da imprensa
flamenga –a mídia tem importante peso no debate identitário atual no
país – passou a destacar constantemente as diferenças fundamentais de
mentalidade e comportamento entre flamengos e francófonos/valões. De um
lado, esses “discursos da diferença” anunciam uma grande distância entre
as duas regiões e sustentam a ideia de que a coabitação desses dois
“povos” sob uma mesma bandeira é cada vez mais insustentável (Sinardet,
2007 apud De Winter, 2008). Por outro lado, De Winter (2008) aponta como
a mídia francófona também se refere de forma preconceituosa com certa
regularidade aos flamengos – sem, no entanto, suscitar dúvidas sobre a
possibilidade de ambos coabitarem uma “mesma Bélgica”.
36A
política também é outro setor que constantemente divide o país. A
história, a política e a economia belgas contribuíram para a formação de
um sistema político no qual os partidos se circunscrevem às regiões,
sendo as fronteiras entre Flandres e Valônia também as fronteiras
ideológicas do país. Essa situação permitiu que alguns políticos tenham
chegado a declarar que “a Bélgica não existe” (Van de Craen, 2002) e que
os únicos fatores que unem o país são “o rei, a seleção de futebol e
algumas marcas de cerveja” (Rennie, 2006: s/p.). Porém, Ian Traynor
(2007) sugeria que esses são sentimentos que não se referem apenas aos
políticos e que a ideia de que a Bélgica seja um Estado artificial tem
alguma popularidade também dentre seus cidadãos.
37O
regionalismo na Bélgica é muito forte e, claro, permeia também a
política. Inclusive, o sistema político adotado no país contribuiu – e
muito – para o acirramento de tensões étnico-culturais belgas. De acordo
com Izquierdo (2014), o imenso poder dos partidos políticos está na
raiz desse problema. O autor reforça que não são os partidos políticos
os criadores dessa cisão, porém eles contribuíram em demasia para o
distanciamento linguístico-cultural que aflige e divide o país hoje e –
ao reforçar as identidades regionais – enfraquece em contrapartida a
identidade nacional.
38Esse
processo de reforço de identidades regionais/enfraquecimento da
identidade nacional se acirrou ainda mais a partir da política federal
de “devolução de poderes” às regiões, iniciada na década de 1970. Quanto
mais poderes as regiões possuíam, maior era o interesse dos partidos
políticos em reforçarem suas identidades territoriais, politizando cada
vez mais as diferenças linguístico-culturais e distanciando os grupos
étnico-sociais.
39O
que hoje é conhecido por Bélgica não existia antes de 1830. Os
territórios que hoje compõem o país foram dominados por várias potências
europeias, como o Império Francês e o Reino da Holanda; o território
que veio a se tornar a cidade de Liège foi um Príncipe-bispado por cerca
de 1000 anos. O país foi formado a partir da união de dois grupos
étnicos e linguísticos distintos: a população de ascendência holandesa,
ao norte e próxima da costa – a região que viria a ser chamada de
Flandres a partir da fundação da Bélgica; ao sul a população
influenciada pela França e cujo território daria origem ao que hoje se
chama Valônia. À essa última região, um pequeno território cuja língua
primária é o alemão viria a ser anexado, após o fim da Primeira Guerra
Mundial e a assinatura do Tratado de Versalhes, em 1919.
- 5 Fundado oficialmente como partido político em 1917, o Frontpartij existiu até 1933. Seu fim está re (...)
40A
Bélgica se tornou um Estado ao declarar independência ao Reino da
Holanda, após uma revolução inspirada por interesses religiosos e
econômicos que uniam os habitantes daqueles dois territórios contra o
rei holandês. O francês foi adotado como língua de jure, enquanto,
não-oficialmente, o país era bilíngue. Isso queria dizer que era o
francês a língua usada nas esferas institucionais e, no intuito de dar
legitimidade ao novo país que surgia, a população de origem holandesa
assentiu – pelo menos neste primeiro momento – com tal resolução. A
capital Bruxelas, inclusive, apesar de estar encrustada em Flandres, tem
uma maioria francófona. Razão disso é o francês ter sido associado,
especialmente nas primeiras décadas da Bélgica, com a língua oficial, a
língua da “elite” (como visto na figura 2). Em meados do século XIX,
movimentos pelo reconhecimento da cultura flamenga conquistaram, junto
ao governo belga, o direito de terem o holandês também como língua
oficial. É interessante notar que um desses movimentos, o Frontbeweging, teve sua origem nas fileiras do Exército belga e mais tarde veio a se tornar o partido conservador Frontpartij.5
41
Figura 2: Regiões belgas com suas comunidades linguísticas (2ª coluna) e fronteiras oficiais (3ª coluna)

Fonte: Isquierdo (2014: 13)
42Com
relação aos mapas, note-se a pequena porção do país onde o alemão é a
primeira língua (2ª coluna, 3º mapa) e também a capital do Estado
Federal, Bruxelas, incrustada na região de Flandres (3ª coluna, 1º e 2º
mapas).
43Durante
as duas Guerras Mundiais, muitos habitantes de Flandres se mostraram
simpáticos às tropas alemãs, em decorrência da adesão de muitos aos
ideais do Pan-Germanismo (uma vez que o holandês é uma língua de raízes
germânicas). Especialmente entre a ala nacionalista, a promessa de mais
direitos aos flamengos originou uma grande adesão aos ideais nazistas.
Esse crescente regionalismo em Flandres provocou a criação de movimentos
também na Valônia, a partir de fins do século XIX. No entanto, com eles
nunca se pleiteou o separatismo e sim a necessidade de se preservar,
acima de tudo, a união belga (Lecours, 2005).
44Nos
anos de 1960, Flandres ultrapassa Valônia nos indicadores econômicos.
Como consequência direta passa a se observar o aumento da pressão dos
movimentos regionalistas flamengos, reivindicando um poder político
regional maior, que condissesse com sua importância econômica. Enquanto
isso, os valões também exigiam do governo central de Bruxelas o aumento
no poder político regional, justamente para contrabalancear a primazia
econômica de Flandres (Izquierdo, 2014). Cedendo à pressão, o governo
federal aprova, a partir dos anos 1970, várias medidas que
descentralizam o sistema político belga, transformando o país,
oficialmente, em uma federação – sistema no qual um governo central
divide seu poder com entidades subnacionais.
45A
crescente descentralização belga nas últimas décadas resultou em uma
configuração política e econômica, digamos, inusitada. A independência
cujas regiões gozam em 2016 internamente também se reflete no contexto
internacional. Tanto Flandres quanto Valônia são entidades subnacionais
bem conhecidas no cenário europeu por terem praticamente total autonomia
para fixarem acordos políticos ou econômicos, inclusive com estados
nacionais. Além disso, a Bélgica é o único país na União Europeia que
requer também que suas entidades subnacionais – além do governo federal –
ratifiquem acordos e tratados do Parlamento Europeu (Izquierdo, 2014).
É possível dizer que nações não
possuem data de nascimento identificada num registro oficial e que a
morte delas, quando ocorre, nunca tem uma causa “natural”. Como disse
certa vez o historiador Fernand Braudel, acontecimentos como esses são
poeira: eles atravessam a história como breves lampejos; mal nascem e já
retornam à noite e amiúde ao esquecimento.
Lilia Schwarcz
46É
assim que a antropóloga Lilia Schwarcz abre seu texto de apresentação à
versão brasileira do clássico de Benedict Anderson (2015 [1991]),
“Comunidades Imaginadas”. É por essa abstração chamada nação – e seus
relativos diretos: nacionalidade e nacionalismo – que muitos morreram e
outros tantos mataram nestes dois últimos séculos; é baseada nela que
acordos econômicos e políticos se desenvolvem; é pelo seu poder que
sociedades se mantêm juntas, sob uma coesão muitas vezes inventada (ou
imaginada).
47Quando
tocamos este tema e especialmente quando citamos Benedict Anderson, é
impossível nos esquivarmos da sua citação mais famosa; talvez porque
tenha se tornado quase um axioma para aqueles que debatem as formações
nacionais a partir de um ponto de vista crítico:
(...) proponho a seguinte
definição de nação: uma comunidade política imaginada – e imaginada como
sendo intrinsecamente limitada e, ao mesmo tempo, soberana.
Ela é
imaginada porque mesmo os membros da mais minúscula das nações jamais
conhecerão, encontrarão, ou sequer ouvirão falar da maioria de seus
companheiros, embora todos tenham em mente a imagem viva da comunhão
entre eles. (Anderson, 2015: 32)
48Dessa
maneira, a essência de uma nação repousa não só no fato de que “todos
os indivíduos tenham muitas coisas em comum”, mas também que “todos
tenham esquecido muitas coisas” (Renan, 1947 [1882] apud Anderson, 2015:
32). “O esquecimento”, prossegue Renan (1995 [1882]: 11), “é um fator
crucial na criação de uma nação, e é por isso que o progresso em estudos
históricos frequentemente significa perigo para o princípio da
nacionalidade”. A ideia é colocada assim pois, frequentemente, a
história de uma fundação nacional nos leva a episódios de uso da
violência e massacres no processo de integração/dominação ou mesmo a
tradições inventadas, como colocam Hobsbawm & Ranger (1984: 9), que
não raro surgem como “(...) coisa de poucos anos apenas – e se
estabelecem com enorme rapidez”. A exposição desses percursos colocaria
por terra toda a legitimidade daquele discurso que funda uma nação.
49O
nacionalismo na Europa é, em linhas gerais, uma dessas tradições
inventadas e que necessitou recorrer à criação de uma continuidade
histórica que se apega a um passado tão distante que extrapola a
linearidade real e, portanto, torna-se difícil de ser refutada. Nasce o
mito nacional, uma narrativa simbólica-imagética. A confecção de uma
bandeira, de um hino-nacional, de um brasão de armas – e de toda uma
liturgia que rege a interação população-símbolos nacionais (cantar o
hino sempre de pé, nunca desrespeitar a bandeira etc.) – é mais um rito
pelo qual as novas práticas são institucionalizadas. Mostrar respeito
aos símbolos nacionais através de práticas de reverência é um ato que,
por si só, já encerra uma aquiescência a uma série de valores nacionais,
compartilhados com o restante da população. Além disso, simboliza
comprometimento com os ideais da nação e uma declaração de lealdade aos
seus projetos futuros.
50Orvar
Löfgren (1991) aponta que a ideia de um “inventário de símbolos
nacionais” surge no século XIX mas só é mesmo posto em prática a partir
do XX. De acordo com essa lista de atributos, toda nação deveria ter:
(...) não só uma língua comum,
mas um passado e um futuro comuns, mas também uma cultura popular, um
caráter ou mentalidade nacional, valores nacionais, talvez até alguns
gostos e uma paisagem nacional (geralmente consagrados na forma de
parques nacionais), uma galeria de mitos e heróis nacionais (e vilões),
um repertório de símbolos, incluindo bandeira e hino, textos e imagens
sagradas, etc. (Löfgren, 1991: 104)
51Quando
lemos esta lista e pensamos no caso belga, por exemplo, podemos nos
perguntar: “o que está elencado nela e que está presente na Bélgica?”. O
país tem três línguas oficiais, um passado que os une fragilmente por
interesses econômicos e políticos e um futuro inquietantemente
desconhecido (com a alta concentração de poder regional, o fraco
centralismo de Bruxelas e ondas de movimentos separatistas,
especialmente vindos de Flandres). A identidade nacional é, nesse caso,
uma mera superposição de clivagens étnicas tradicionais. Porém, é um
país que hoje (ainda) se encontra uno, num processo onde a identidade
nacional de certa maneira ainda consegue transcender e subordinar outras
lealdades, sejam elas regionais, étnicas ou então baseadas em classe,
gênero ou religião (Löfgren, 1991).
- 6 Maurice Agulhon (1987) descreve a “Grande Cultura” (La Grande Culture) como capital cultural normat (...)
52Contudo,
além dessa série de “grandes” símbolos nacionais oficiais ou
institucionalizados, Löfgren aponta também para a apreciação de valores
triviais como um poderoso mecanismo de identificação da população com
sua nação. Billy Ehn (1988), citado por Löfgren (1991), fala das imagens
relativas ao “ser sueco” evocadas a partir da memória de sabores e
cheiros emanados da tradicional refeição de verão com picles de arenque,
batatas e aquavita: “um fenômeno que espelha todo um universo cultural,
imagens do verão, festividade, prazer e sentimento de pertencimento a
uma nação” (Ehn, 1988: 14 apud Löfgren, 1991: 109). Löfgren (1991: 109)
coloca isso como “experiências de alto peso cultural específico”. A
atenção a essa “pequena cultura” é um contraponto à “Grande Cultura”,6
associada aos grandes símbolos nacionais e veiculada essencialmente
através das esferas públicas de comunicação. Dessa maneira, qual
“capital cultural” prevalece na formação de uma “cultura nacional”?
53Löfgren
(1991) aponta que essa é uma questão de possibilitar e incentivar a
comunicação e a interação em níveis nacionais: a criação de uma nação é
sobretudo um projeto de integração da população e estandardização da
base cultural (ao menos simbólica). Muito da “nacionalização” cultural
esteve – e está – ligada à criação de uma “esfera pública” por parte da
classe dirigente burguesa que permitisse o debate e a disseminação de
informação; é o processo de transformação de um discurso público em um
discurso nacional – uma transposição. É também o que se observa na
França da Terceira República e a disseminação de manuais no âmbito
escolar.
54Se
apoiando em Anderson (2015 [1991]), Löfgren (1991) chama atenção para a
importância da imprensa escrita para a difusão de uma “cultura comum” a
partir, especialmente, do século XVIII. Dessa maneira, intelectuais
podiam trocar ideias e disseminar experiências que contribuíssem para a
delineação de uma cultura dita nacional. Löfgren (1991: 111) cita o caso
dos jornais impressos locais para a criação de uma coesão cultural na
Suécia durante esse período; dessa maneira, os “doutores e burocratas do
interior” (aqueles que podiam ler em sueco) podiam ao menos se sentir
parte do discurso nacional que se formava a partir da capital,
Estocolmo. Aqui nós chamamos atenção para o caso supracitado, do papel
das mídias regionais na Bélgica – mas não para a conformação de uma
cultura comum nacional, e sim para a delineação cada vez mais precisa do
que é ser “valão” ou ser “flamengo”. Nesse caso, a mídia contribui para
o reforço da identidade, porém uma identidade regional, que enfraquece o
sentimento de coesão e de pertencimento ao país.
55A
globalização e o imperialismo cultural cada vez mais intensos,
especialmente daquela cultura vinda dos Estados Unidos, podem ser vistos
como fatores que contribuem para a desestabilização da cultura
nacional. Porém, Doreen Massey (1994) e Stuart Hall (2015) apontam para o
fato de que cada sociedade absorve de uma maneira distinta esta cultura
“importada”; a “lê” de uma forma, baseada no capital cultural corrente
ali e a processa de maneiras que irão variar entre si, dando origem a
uma cultura nova, “híbrida” e diferente entre os países, mesmo os
ocidentais. Löfgren (1991) complementa essas postulações ao dizer que o
discurso de desintegração nacional geralmente não leva em conta o fato
de que a cultura nacional é constantemente redefinida:
Cada nova geração produz sua
própria base de referência nacional, selecionando itens da matriz
simbólica de gerações anteriores. Geralmente não é a nação que está se
desintegrando e sim uma versão mais antiga do ideal nacional. (Löfgren,
1991: 113)
56Assim,
podemos concluir que apesar da troca cultural ser cada vez maior entre
países, especialmente os ocidentais, e da influência praticamente
onipresente da cultura estadounidense, ainda é possível detectarmos
“culturas nacionais”. A constante transformação cultural afeta
diretamente a construção identitária de indivíduos e grupos, e está na
compreensão desta lógica de constante releitura e “renovação” cultural o
ponto-chave para entendermos onde possa se localizar o debate sobre a
identidade atualmente.
57Apesar
da globalização e de uma discutível “homogeneização” cultural que ela
traz, podemos ser categóricos ao enfatizar que identidades nacionais e
subnacionais ainda persistem, muitas vezes se reinventando ao longo do
processo. Dados expostos por De Winter (2008) e pela Presse Regionale
(2014) mostram que na Bélgica e na França, o processo de reforço da
identidade regional/subnacional, inclusive, aumentou nas últimas
décadas. Esse é o panorama encontrado para as três regiões subnacionais
trabalhadas aqui: Nord-Pas de Calais, Valônia e Flandres.
58Isso
indica que o projeto da Eurometrópole Lille-Kortrijk-Tournai, onde se
pretende a fusão de três regiões subnacionais, duas línguas e dois
países, não será necessariamente suave ou se dará de forma “natural”.
Apesar da crescente globalização que engendra o que Milton Santos (2012)
chamou de “a nova consciência de estar no mundo”, a herança cultural
esculpida a partir da história dessas regiões e países ainda têm um
importante e pesado papel a jogar no século XXI.