1Esse artigo tem como objetivo tratar as novas mudanças econômicas e sociais ocorridas no espaço metropolitano do Rio de Janeiro após o início do século XXI decorrente de grandes investimentos ligados à cadeia produtiva do petróleo. Esse processo decorre com base em políticas nacionais de incentivo em base de produção, trazendo uma nova dinâmica econômica com a implantação de grandes projetos que se tornaram indutores de investimento e concentração de atividades produtivas.
2No Leste Metropolitano do Rio de Janeiro (LMRJ), essas significativas transformações se iniciaram consequente à inserção do COMPERJ em Itaboraí, que resultou em uma nova reestruturação espacial, pois a construção de novas infraestruturas logísticas no território passou a definir uma nova organização espacial que desempenhou uma nova circulação e integração no território.
- 1 Atualmente é pensada uma nova funcionalidade ao COMPERJ, inicialmente uma indústria petroquímica, q (...)
3O COMPERJ1 (Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro) foi um projeto iniciado em 2006 e incluído no Programa de Aceleramento de Crescimento (PAC) em 2007, tendo como objetivo o beneficiamento do petróleo que seria extraído da costa brasileira e destinado a produção de insumos químicos para petroquímica brasileira. Essa extração viria diretamente da área do pré-sal, especificamente da bacia de Campos e bacia de Santos. A construção desse empreendimento demandou muitas outras infraestruturas que se integrassem para a dinamização do setor no território. No LMRJ foram construídas infraestruturas logísticas para a movimentação de pessoal, equipamentos e grandes cargas, isso fomentou em extensos projetos de infraestrutura logística chamados de “extramuros” (para além das limitações do COMPERJ). Nos municípios de São Gonçalo e Itaboraí esse sistema logístico extramuros foi direcionado para o transporte de cargas especiais ultra pesadas e de grandes dimensões do COMPERJ, que passou a ser chamado de UHOS (Ultra Heavy Over Size). A UHOS é comporta por um porto (píer e retroporto) e uma estrada de 18 km, ligando a Baía de Guanabara ao COMPERJ, o trajeto se inicia na praia da Beira em Itaóca, em São Gonçalo e finaliza em Itambi, Itaboraí, atravessando diferentes comunidades. Após o uso destas infraestruturas, elas passariam a gestão da administração municipal de São Gonçalo e o Estado do Rio de Janeiro para a sua refuncionalização em um projeto que promovesse melhorias na capacidade de produção da região.
4A partir disso, foi idealizado a “Cidade da Pesca”, um projeto que iria refuncionalizar toda a infraestrutura existente, que incluiria um terminal pesqueiro (TPP) e um condomínio industrial. Esse projeto visava uma nova centralidade do setor pesqueiro ao ERJ, abarcando grandes empresas do setor de pescado e apresentando melhorias para a pesca tradicional já existente na região.
5Todo o processo de mudanças até então tratados são a partir de 2006 com o início do projeto do Comperj em Itaboraí, até 2016, quando foram finalizadas a primeiras infraestruturas logísticas de transporte de equipamentos para o COMPERJ e que até então foram abandonadas pelo poder público e a Petrobrás.
- 2 OLIVEIRA, Floriano J.G; CANDIDO, D’Jeanine. Investimentos produtivos, territorialidades e gestão no (...)
6A realização desse estudo é referente aos anos de iniciação científica no período de graduação, que resultou na monografia no final do curso, e a elaboração de um artigo em um capítulo de um livro2. Nesse artigo, foi desenvolvido análises com uma abordagem mais ampla com relação as infraestruturas interligadas ao COMPERJ, que configuram em grandes mudanças não apenas no LMRJ, mas em todo o Estado do Rio de Janeiro, em um processo de reestruturação espacial decorrente dos Grandes Projetos de Investimento (GPI). O grau de importância dos GPI’s é em decorrência do seu poder de indução e efeito no território, por serem projetos de grande magnitude investidos pelo poder público.
7O presente trabalho estará focado as mudanças ocorridas no LMRJ, com ênfase nas cidades de São Gonçalo e Itaboraí, onde está instalado o sistema UHOS. Logo, essa pesquisa tem como objetivo analisar os diferentes usos do território a partir de novas redes técnicas instaladas em razão do COMPERJ, bem como os investimentos públicos e privados em razão dessas novas infraestruturas. A fim de compreender a formação de novos arranjos viários que possibilitam novos fluxos e novas áreas estratégicas de produção e sua repercussão no poder público local e na comunidade.
8Para a realização desse debate o texto se inicia expondo o cenário econômico do LMRJ para então apresentar as fundamentações teóricas que possibilitam compreender como se desenvolve a formação de áreas estratégicas para o capital com a construção das redes técnicas. Complementando, observa se uma rugosidade no cenário em questão de justaposição entre o antes e o depois da construção de bases logísticas.
9Posteriormente, é exposto de forma mais analítica como ocorreu essas mudanças territoriais e as repercussões na inserção dessas bases logísticas na região, como também, a ausência de planos estratégicos posteriores ao sistema UHOS, ou mesmo a viabilidade de colocar em prática os já existentes como a Cidade da Pesca. Ao final, chega se a discussão das dificuldades do poder público local para empreender projetos de demandas regionais, o tem resultado na depreciação das infraestruturas deixando ares entre expectativa e frustração.
- 3 O COMPERJ se torna um plano nacional estratégico para desenvolvimento do Estado e região, com base (...)
10Com o início de um projeto político de desenvolvimento econômico-industrial no Brasil no início do século XXI, atingindo fortemente o Estado do Rio de Janeiro, principalmente no setor de petróleo e gás, e viu se novamente uma redinamização econômica que culminou na criação do COMPERJ3 em 2006 no leste da região metropolitana fluminense. Esse projeto não só estava direcionado a produção de refino, como também na produção de resinas termoplásticas, o que se tornaria um grande indutor de indústrias de 2ª geração (direcionadas ao processo de fabricação de manufaturas para o abastecimento de fábricas) e de 3ª geração (que produziriam o produto final para bens de consumo). A cadeia de condução do Complexo Petroquímico resultou na formação de outros Grandes Projetos de Investimento (GPI), que foram projetos infraestruturais de grande magnitude desenvolvidos pelo poder público formando um novo reordenamento territorial.
11O Complexo Petroquímico não só era direcionado aos interesses técnicos e estratégicos, como também político, ao dispor e capacitar à mão de obra existente. Por esse motivo a instalação do COMPERJ foi decidida após muitos debates, a decisão esteve baseada nos problemas estruturais e sociais existente na região, visto que o empreendimento visava o fortalecimento produtivo que resultaria em melhorias de emprego e renda a população.
12A RMRJ é resultado de um processo de expansão metropolitana que veio se desenvolvendo ao longo dos anos, e que o COMPERJ fortaleceu. Conforme Sandra Lencioni (2017), a metropolização do espaço reflete as transformações do espaço urbano nas grandes cidades e o seu processo de dilatação. Esse fenômeno constitui um espraiamento da cidade e a formação de uma região que aumenta conforme a circulação de informações, pessoas, serviços e etc. No entanto, esse fenômeno é disperso e fragmentado, mas mantém a sua totalidade, ou seja, com diferenças e semelhanças, constituindo uma totalidade em que as partes que compõe a região também têm pontos em comum. No contexto metropolitano do Rio de Janeiro, municípios passaram a fazer parte da região metropolitana após a inserção do COMPERJ em Itaboraí. Isso decorre de novos fluxos presentes por meio da circulação, viabilizando também uma ligação política entre as administrações públicas locais.
13Para melhor compreensão dessa expansão, é preciso entender a composição político econômico da região, para que posteriormente fiquem claros como se deu as expectativas de recuperação econômica e a formação de novas territorialidades a partir das novas bases logística que foram inseridas após o anuncio do Complexo Petroquímico.
- 4 O Leste metropolitano junto com a Baixada fluminense e o Oeste metropolitano compõe juntos a região (...)
- 5 O LMRJ tem um teor mais analítico do que administrativo.
- 6 IBGE. Arranjos Populacionais e Concentrações Urbanas do Brasil. Rio de Janeiro, 2015. Disponível em (...)
- 7 Plataforma IBGE cidades – panorama Trabalho e rendimento [2010 – 2016]- Disponível em: https://cida (...)
14Á leste da Baia de Guanabara encontra se cidades que compõe o Leste Metropolitano do Rio de Janeiro (LMRJ)4, esta região representa 9,6% do PIB do Estado e 13,7% da população fluminense. Esta delimitação regional5 é composta pelos municípios de Itaboraí, Magé, Niterói, São Gonçalo, Tanguá, Maricá, Cachoeiras de Macacu e Rio Bonito, sendo que os dois últimos só passaram a fazer parte da RMRJ após o COMPERJ. O LMRJ assim como toda a região metropolitana fluminense tem altos índices de fluxos de trabalhadores, que apenas entre as cidades de São Gonçalo e Niterói compõem um movimento pendular de aproximadamente 120 mil pessoas por dia6. Com a baixa concentração de atividades industriais e produtivas na região, esse fluxo tende a se manter. O movimento pendular de pessoas que saem de suas cidades para trabalhar em outras, mostra se como um indicativo das deficiências dos municípios na geração de emprego e renda. O município de São Gonçalo detém apenas 12,6 % de empregos formais em sua cidade, considerando que este mesmo município tem a segunda mais população do Estado com mais de 1 milhão de habitantes7. Outros municípios mantém a mesma média como Itaboraí, com 13,2% de empregos formais, ou Maricá com 11,7%, enquanto a cidade de Niterói tem 40% empregados em relação ao total de sua população, sendo o 2º maior empregador formal da Região Metropolitana. O diferencial histórico de Niterói em parte se dá ao seu histórico como cidade capital do Estado até 1975 com modernizações e reestruturações urbanas, por grandes investimentos públicos e crescimento no setor imobiliário, se tornando uma importante centralidade econômica no Leste Metropolitano.
- 8 Com exceção da cidade de Niterói, com base nos estudos socioeconômicos do Tribunal de Contas do Est (...)
15Apesar da capital do Estado passar por uma densa desindustrialização, sua centralidade para o fornecimento de emprego se manteve, porém o nível de desemprego até o início do século XXI foi bastante significativo. As cidades do LMRJ têm grande dependência de transferências intergovernamentais dos recursos públicos e um déficit na arrecadação tributária8, o que resulta na deficiência dos serviços públicos. O setor administrativo do poder público representa boa parte dos recursos públicos, e os investimentos nas cidades são baixos. Os maiores setores de atividade econômica no LMRJ são o comércio, a administração pública e serviços. O cenário regional de desindustrialização na RMRJ pôde ser modificado a partir da inserção do COMPERJ e a construção de outros investimentos públicos associados, quando passou a induzir maior interesse do setor industrial na região.
16A elaboração de suportes logísticos e estratégicos de circulação é de grande importância quando se é pensado a construção de Grandes Projetos de Investimento (GPI), pois estes resultam em uma nova organização territorial pelo dinamismo que produzem. A construção de infraestruturas para a conexão de fluxos no território, como redes de transporte e redes de comunicação, compõe um sistema importante que são as redes técnicas. Esses instrumentos constituem uma modernização no espaço urbano e permite condições básicas, mas não simples, para a circulação de pessoas, bens materiais e informação. As redes técnicas funcionam para a ação de atores econômicos, político ou social no território, a fim de proporcionar uma lógica espacial de circulação de produção.
17Milton Santos esclarece que as redes técnicas são objetos que favorecem a fluidez, “objetos que transmitem valor as atividades que dele se utilizam” (SANTOS, 2006[1996]), sendo a fluidez uma categoria socio técnica, ou seja, resultado da interação entre pessoas e a tecnologia.
18No caso em questão, o projeto “extramuros” do COMPERJ resulta na construção de redes técnicas no território com a instalação de grandes infraestruturas como suporte logístico da Petrobrás. Esse sistema nomeado UHOS (Ultra Heavy Over Size), formou uma nova reestruturação espacial, integrando pontos estratégicos entre a Baia de Guanabara até o Complexo Petroquímico. Todo o sistema é comporto por um porto constituído por um píer e um retroporto interligado a uma estrada particular específica para o transporte de cargas ultrapesadas e de grande dimensão, atravessando deferentes bairros da cidade de São Gonçalo e Itaboraí, o que contribuiu para a formação de novas territorialidades.
19Logo, essa relação entre as redes técnicas com o território está intimamente interligada às relações de poder, pois a formação de novos fluxos de circulação bem como os diferentes pontos de integração adquire grande relevância política, econômico e cultural. Sendo assim, as redes técnicas constituem um artefato técnico que exerce poder, e que está relacionado ao uso e controle dessas infraestruturas e não nelas em si. O que ajuda compreender como se dá a relação do sistema UHOS, com a comunidade e o Estado, o empresariado, ou mesmo das organizações criminosas. Como afirma Santos, “as redes são técnicas, mas também sociais” (...) exercendo um sistema “estrutural e funcional” (2006[1996]:187).
20Por isso ao observar as relações de poder no território e o seu uso, se torna perceptível o estabelecimento na formação de novas territorialidades nas áreas onde foram instaladas as redes técnicas:
(...) territorializar-se, hoje, implica a ação de controlar fluxos, de estabelecer e comandar redes. (...) elas jamais são completamente desmaterializadas, estão sempre, de uma forma ou de outra, desenhando materialmente territórios, novos territórios, com uma carga muito maior de imaterialidade, é verdade, mas nem por isso ‘não-territoriais’.(HAESBAERT, 2004, p.301)
21Portanto, a partir da inserção de novas redes técnicas ao território contribuindo na formação de novas territorialidades, o estado funcional das infraestruturas é determinado pelo uso, o que torna as redes técnicas simultaneamente estáveis e dinâmicas, de “fixo intercorrente de fluxos” (SANTOS 2006[1996]:188). Mesmo com a ausência do Estado e da Petrobrás as infraestruturas do sistema UHOS, estas não deixam de exercer função, sendo para a recreação, como a pesca, ou mesmo para a conexão, sendo usada por moradores, ou na ação de grupos criminosos nas comunidades de São Gonçalo e Itaboraí tornando se um novo circuito interno para o comércio ilícito de armas e drogas nas comunidades.
22Para além dessas relações, inclui se a ligação das infraestruturas com o poder público no que se refere a refuncionalização desses ativos para a promoção políticas públicas na região, ou mesmo a aproximação com a comunidade com serviços públicos. Até então, com a finalização do uso das infraestruturas pela Petrobrás, estas passariam pra o poder público local, o que resultou na apresentação de um projeto, a “Cidade da Pesca”. Porém, a ausência de ações tem como efeito a paralisação e revogação de projetos que viabilizassem o reaproveitamento dessas infraestruturas. O resultado do abandono do poder público local compromete em pôr a frente novas possibilidades de crescimento econômico na região.
23Outra questão importante, se refere a compreensão da funcionalidade das formas que estão dispostas no território. Ao ter funções diferentes da sua função “original”, as redes técnicas existentes também adquiriram o que Milton Santos definiu como rugosidade:
“(...) se apresentam como formas isoladas ou como arranjos (...) restos de divisões do trabalho já passadas (todas as escalas da divisão do trabalho), os restos dos tipos de capital utilizados e suas combinações técnicas e sociais com o trabalho.” (SANTOS, [1996] 2006: 92)
24As transformações de forma concreta que estão instaladas até então se tornaram parte de uma paisagem, e a sua presença passa a definir e determinar a função do lugar a posteriori de sua construção. Sendo o espaço uma produção social, e não sendo um cenário passivo, a interferência de ações e objetos trazem uma nova significação e valorização ao lugar. A existência da Capela Nossa Senhora da Luz, do século XVII, em Itaoca, até mesmo das infraestruturas inseridas a partir de 2013, são carregadas de significação e valor, de uma justaposição temporal e espacial.
25A rugosidade está atrelada a sua relação espaço e tempo, redefinindo lugares com base em uma reestruturação, estabelecendo uma divisória entre o anterior e o posterior, em uma nova forma e função. A inserção de novas estruturas define mudanças e cria novas adaptações e relações com o meio, com base na influência dessas “manifestações concretas” (SANTOS, [1978] 2002:173).
26Tal influência é uma herança, mas não apenas como algo do passado, se manifesta em tempos cruzados numa sucessão de objetos justapostos (sobrepostos) que atua de maneira concreta mediante o processo social. A nova realidade em que esses objetos passam a exercer no espaço aparece registrando uma forma para o seu uso. Ao finalizar a função inicial do porto ou da estrada UHOS, elas passam a exercer novas determinações naquele lugar, adaptando se a novas condições e se tornando eficaz na realização de outras funções ao qual antes não havia sido planejado. Além de sua influência sobre o espaço anterior a sua construção, o próprio objeto também muda sua funcionalidade.
27A ressignificação e a valorização estão relacionada as políticas territoriais o que torna elementar a produção de projetos de interesses diversos e que pode não está necessariamente relacionado aos interesses sociais. As redes técnicas podem ser construídas com um propósito que se modifique com o tempo, proporcionando outras práticas, dando uma refuncionalização.
“Os espaços, isto é, a mescla de estruturas que o caracterizam, são, a cada momento, mais ou menos infensos, mais ou menos abertos, a influências novas. Há desse modo, uma receptividade específica dos lugares, ocupando os vazios, aos fluxos de modernização ou inovação.” (SANTOS, [1978] 2002: 260)
28Dentre os projetos planejados passíveis de grande mudança, o TPP (Terminal Pesqueiro Portuário), junto com a estrada UHOS, formam novos eixo de circulação por diferentes bairros de São Gonçalo e uma interligação com o Arco Metropolitano. As transformações ocorridas no território têm trazido diferentes formas de usos e sobreposições espaço temporais entre outros desdobramentos em curso, que resultam em processos e dinâmicas territoriais. Junto as infraestruturas da UHOS, encontram se áreas de lazer e locais de valor histórico, como a Capela e Fazenda da Luz em Itaóca, em que diferentes estruturas espaço-temporais estão mescladas no espaço.
29A identificação dessas estruturas nos mostra alterações importantes que se sucederam com o passar do tempo, criando novas territorialidades mesmo que a gestão pública não esteja presente. O bairro apresenta 2 momentos (o que estava antes das infraestruturas logísticas e posteriormente a construção) em que nenhuma delas tem sido discutido suas potencialidades para melhorias para a valorização do bairro que promovesse mudanças de melhoria de vida da população local.
30Para melhor compreender esse processo de refuncionalização das redes técnicas existentes, é preciso conhecer o que levou a essas mudanças a partir de projetos, que tinham como principal função a conexão de pontos estratégicos relacionados ao setor petroquímico. Para a construção do Comperj uma gama de equipamentos foi necessária, tanto no processo de construção quanto o de montagem, exigindo estruturas logísticas não apenas do próprio empreendimento, como também ao seu suporte. As redes técnicas são necessárias para a demanda de fluxo de cargas, trabalhadores e serviços, como o Arco Metropolitano, assim como a duplicação da BR101, que conectam pontos estratégicos que possibilitem uma distribuição local e regional, formando um importante arranjo espacial. Esses arranjos ocorrem segundo uma reestruturação espacial, adquirindo alta mobilidade com base na elaboração de redes técnicas que possibilitará uma expansão com expressiva circulação e integração. No caso do COMPERJ, específicos sistemas logísticos de transporte foram importantes para o carregamento de equipamentos especiais para processo de refinamento de petróleo, como filtros, vasos e torres, que servirão para a destilação, produção de óleo combustível, coque e enxofre entre outros. Esses equipamentos são ultra pesados e de grandes dimensões, tendo sido importados sob encomenda especificamente para o Complexo petroquímico em Itaboraí e recebidos por via marítima e desembocados no Porto do Rio, no bairro do Caju, na cidade do Rio de Janeiro.
31A distância entre o COMPERJ e a Baía de Guanabara é de aproximadamente 17km de distância, e as estradas existente, além de não suportarem o peso e a dimensão dos equipamentos ultra pesados, também já estavam saturadas da carga de fluxos de carros. É justamente nesse momento que os projetos “extramuros” mostram a sua importância, pois tinham como o objetivo suprir o transporte de cargas especiais vindos da Baia de Guanabara em direção ao COMPERJ, o sistema UHOS (Ultra Heavy Over Size).
32Esse sistema tinha a capacidade de transportar cargas ultra pesadas com praticidade e segurança, pois esses equipamentos têm em média 1000 toneladas, 40 metros de comprimento e 12 metros de diâmetro, e exigem muita técnica na sua condução. Alguns estudos prévios foram feitos para o transporte dessas cargas, mesmo antes das contratações do Comperj em 2008, que resultou no levantamento de 6 alternativas. Uma delas estava baseada na utilização de rios para o transporte, já que a região é composta por uma rede fluvial. Essa alternativa faria uso do rio Guaxindiba, dentro da APA de Guapimirim, desassoreando o rio para que comportasse a dimensão das balsas para então desembarcar no bairro de Itambi, Itaboraí. No entanto, com o veto de forças ambientais esta alternativa foi descartada, pois comprometeria a biodiversidade do local que já é bem comprometida.
33A alternativa encontrada foi um projeto que era subdividido em 2 partes, via marítima composta por dragagem para a construção de um píer e uma retro área; e uma terrestre, com uma estrada de 18 km, ligando o bairro de Itaóca, na cidade de São Gonçalo a Itambi em Itaboraí, conectando com a BR 493 (Arco Metropolitano) e também com a Estrada do Convento, estrada de acesso principal ao Comperj.
Figura 1. Imagem da área do retroporto e do Comperj, 2018.
Fonte: Google maps. Imagem da autora.
34Todo o projeto durou em torno de 4 anos, repercutindo em grandes mudanças no território e esteve intimamente envolvida com outros projetos públicos. A estrada entre o porto de São Gonçalo e a estrada do Comperj, foi construída entre manguezais e moradias, o que mostra sua grande relação com impactos sociais e ambientais. Ela é particular e também foi nomeada como UHOS, seu trajeto pode ser analisado em duas partes: o primeiro trecho com 11 km, que se inicia em Itaóca até Guaxindiba (UHOS 1), e o segundo trecho que tem 7 km ligando os bairros de Guaxindiba a Itambi (UHOS 2). Como já dito, o transporte dos filtros e vasos ao Comperj, exige uma minuciosidade e técnica dos operadores, sendo também necessária a utilização de veículos exclusivos, um tipo de carreta com suspensão hidráulica, uma “linha de eixo para transporte pesado”. Cada peça foi transportada por veículos conforme a imagem abaixo, com 18 eixos, levando aproximadamente de 3 a 4 dias entre o porto e o COMPERJ.
Figuras 2 e 3 - Veículo hidráulico utilizado no transporte de cargas especiais do Comperj.
|
Fonte: (A) PESSANHA,2015; (B) Arquivo pessoal,2015.
|
35As obras da estrada UHOS iniciaram em 2013, mas foi finalizada somente em 2015, pois houve atrasos no processo de desapropriação e paralisação dos contratos com as empreiteiras responsáveis pelo projeto. A primeira parte da estrada foi construída de brita, com uso de aterros e pontes, em razão de extensas áreas alagadiças, de várzeas e manguezais. Esse segmento atravessa bairros carentes da cidade de São Gonçalo, como Fazenda dos Mineiros, Salgueiro, Palmeiras, Jardim Catarina, Santa Luzia e Guaxindiba, permitindo uma integração desses bairros, que antes não existia.
36O uso da Petrobras com o sistema UHOS era temporário, e tinha o objetivo apenas para o transporte das cargas ultrapesadas. No entanto, já no início do projeto foi definido que as infraestruturas seriam colocadas para a administração local para que fossem devidamente refuncionalizadas em prol do desenvolvimento econômico da região. Todo o sistema UHOS foi projetado estrategicamente interligando importantes eixos viários, tornando uma estrada um alto potencial de uso estratégico possibilitando que em projetos futuros, toda a região pudesse está articulada para o transporte de cargas e utilidades industriais e comerciais. Seu trajeto permite a conexão com a BR 101 em Guaxindiba e com a BR 493 (o Arco Metropolitano) em Itambi, com proximidades ao trevo de Manilha em Itaboraí que permite também o acesso a RJ 116, e com a estrada principal do Comperj.
- 9 Também um importante Parque Paleontológico da região.
37Entre os dois trechos da estrada UHOS, existe um polo industrial antigo da cidade de São Gonçalo, que passou a receber novas industriais após a anunciação do COMPERJ. Esse ponto se tornou de grande importância, pois juntamente ao polo industrial, projetos após o uso da Petrobrás foram definidos em conjunto com o sistema UHOS, que incluía a construção de um Terminal Ferroviário na Linha 3 interligando o centro de Niterói a Guaxindiba em São Gonçalo, junto com a expansão ferroviária ou rodoviária para Visconde de Itaboraí. O segundo segmento da estrada UHOS, ligando Guaxindiba a Itambi, é justamente o trecho em que se projetava tal expansão viária, nessa parte da estrada já possui uma antiga linha férrea da década de 1930, quando se inaugurou a primeira fábrica de cimento da região, a Companhia Nacional de Cimento Portland, que a utilizava para o transporte de vagões até São José, em Itaboraí, onde tinha uma mina calcária, hoje um lago devido a escavação da mineração9.
- 10 Segundo informação da Petrobrás ao TCU Auditoria – TC 006.283/2013-6
38O sistema UHOS foi subdividido em três contratos: (i) o píer com retroporto e a dragagem para o atracamento firmado com a empresa Constremac Construções LTDA; (ii) a estrada UHOS firmado com a empresa Engesa Engenharia S.A e; (iii) a Estrada do Convento, principal via de acesso ao Comperj, firmado pela empresa Encalso Construções LTDA. Todo processo resultou na desapropriação de aproximadamente 1200 terrenos e residências, totalizando 90 mil metros quadrados10
- 11 Conforme EIA_RIMA: via especial para transporte de cargas especiais para o Comperj. Petrobrás
39A UHOS está além de um sistema de transporte de equipamentos ao Comperj, esta configura uma infraestrutura potencial a locomoção e movimentação de cargas e pessoas, formando uma nova configuração territorial potencial para o setor industrial e/ou comercial. Esse sistema foi previsto para sua integração a malha viária regional, sendo necessário após o uso da Petrobras, sua adequação ao tráfego comum11.
A CRIAÇÃO DE UM PORTO EM SÃO GONÇALO: SUA FUNÇÃO ORIGINAL E SEU POTENCIAL DE USO.
40A construção de um porto em São Gonçalo é parte do sistema UHOS, conectando o transporte marítimo dos equipamentos ultra pesados a estrada de mesmo nome até o acesso principal do Comperj. O porto fica localizado na Praia da Beira no bairro de Itaóca em São Gonçalo, ao lado de um lugar mais conhecido, a Praia da Luz, um lugar de importância histórica da cidade.
41O bairro é um lugar carente da cidade, quase ermo, possui muitos problemas de infraestrutura e ausência de muitos serviços públicos. Apesar disso, sempre foi um ponto de recreação e lazer, com venda de pescado em quiosques, fruto do trabalho da colônia de pescadores e de catadores de caranguejo do local.
42Em meio ao grande empreendimento que se encontra na praia da Beira, podemos observar o grande valor histórico, arqueológico e natural do lugar. A praia da Luz possui uma importante capela ao qual dá o seu nome, Igreja Nossa Senhora da Luz, em estilo barroco erguida no século XVII após uma promessa de um sobrevivente de um naufrágio. Essa capela é uma das mais antigas do país e só se tornou um patrimônio da cidade São Gonçalo em 1985, sendo reformada apenas em 2001, após um trágico acidente de derramamento de óleo na Baia de Guanabara. Esse evento acabou por chamar atenção do poder público após grande repercussão midiática, o que sucedeu a revitalização do prédio histórico. Entretanto, após esse caso, o bairro e a capela retomaram aos seus antigos problemas ligados a falta de segurança pública, e serviços urbanos.
43A região também é rica em seu bioma natural, estando ao lado da APA de Guapimirim, que até antes das obras da Petrobrás, o manguezal chegava a ultrapassar a área de preservação. Em contraponto, a área também é lembrada pelo descaso público de muitos anos, que até poucos anos era local de despejo de lixo da cidade, que só foi desativado em 2012, mas que ainda é utilizado na clandestinidade.
Figura 4 - Capela Nossa Senhora da Luz, 2016
Fonte: Arquivo pessoal.
- 12 Auditoria TCU - TC 006.283/2013-6
44Em meio a esse cenário, a chegadas de empreendimentos no bairro trouxe grande expectativa à comunidade. A construção do píer e do retro área somam aproximadamente 9 mil metros quadrados, e chegava a comportar em sua retro área 6 ou mais equipamentos de uma só vez. Ao todo foram 14 equipamentos importados.12
45A construção do porto consistiu em um canal de navegação feito por dragagem para a trafegabilidade das balsas; a construção de um píer para a atracação e descarregamento, e uma retroporto para o armazenamento e manobra dos grandes equipamentos. Até a finalização da construção do píer e retroporto passaram se 1 ano e meio, para então os equipamentos ultrapesados que estavam na maioria na Ilha do Governador pudessem vir por balsas. Esses equipamentos estavam à espera da finalização do porto desde 2011, quando os primeiros vasos e torres chagaram ao Porto do Rio.
Figura 5 e 6 - Imagem: Equipamentos ultra pesados e de grandes dimensões no Porto da praia da Beira em São Gonçalo, 2015.
|
Fonte: Arquivo pessoal.
|
46Todo o processo de construção consistiu na contratação de mão de obra local, o que gerou muita expectativa dos moradores. A base logística inserida previa o melhoramento econômico da cidade, visto que este seria refuncionalizado para projetos futuros por parte do poder público.
47Apesar de alguns contratempos com relação a desapropriações, a comunidade e pequenos comerciantes viam o empreendimento com grande expectativa alimentada pelo um novo projeto que se chamaria “Cidade da Pesca”, que tinha o objetivo de colocar o ERJ em um novo patamar industrial pesqueiro.
A CIDADE DA PESCA: A POSSIBILIDADE DE UM NOVO CENÁRIO PARA O SETOR INDUSTRIAL PESQUEIRO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
48O Estado do Rio de Janeiro tem uma importante tradicionalidade do setor pesqueiro como local de desembarque e abastecimento do pescado. No entanto, com o passar dos anos, a falta de infraestrutura e ambiente de precariedade tem resultado no declínio dessa atividade no Estado. Entre os maiores polos pesqueiros do Estado, está São Gonçalo, Niterói, e na cidade do RJ, nos bairros da Ilha do Governador e do Caju.
49O principal entreposto de pescado na região metropolitana era o mercado de peixe na praça XV, criado em 1934. Na época grandes empresas de pescado se instalaram na região e boa parte era de empresas de enlatados. Esse entreposto foi uma modernização importante no Rio de Janeiro, que veio acompanhado com o processo de industrialização da época, isso colocou o ERJ em um novo patamar competitivo do setor.
50Contudo, com a desativação do mercado de peixe em 1991, grande parte do desembarque do pescado passou a ser na Ilha da Conceição em Niterói, ou no CEASA (Central de abastecimento do ERJ) no bairro de Irajá, na cidade do Rio de Janeiro. Desde então, o setor tem tido cada vez mais dificuldade no transporte e conservação do pescado. A falta de um terminal público pesqueiro de grande porte tem sido uma necessidade de décadas.
51Com o histórico de precariedade do setor pescado, e com base na refuncionalidade do recém porto de São Gonçalo deixado pela Petrobrás, o SEBRAP (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional, Abastecimento e Pesca) apresentou uma proposta à prefeitura em 2013, para que fosse desenvolvido um projeto que otimizasse o abastecimento e aumentasse o setor industrial de pescado na região. Esse projeto foi chamado de Cidade da Pesca, que tinha o objetivo de criar um Complexo industrial no setor de pescado, com um eficiente terminal público pesqueiro para o ERJ.
- 13 Decreto municipal nº 336/2008.
52O sistema UHOS já possuía um protocolo de intenção mesmo antes de ser construído, nesse documento a Prefeitura de São Gonçalo e o ERJ se comprometiam para que a estrada e o porto pudessem ter uma nova funcionalidade. Por esse motivo, desde 2008, a prefeitura já decretava a desapropriação de loteamentos em Itaóca para fins de utilidade pública, enquadrando a área como ZUPI (Zona de Uso Predominantemente Industrial)13, igualmente como ocorre no bairro de Guaxindiba, em que é certificando pelo poder público o surgimento de bases industriais na região.
Figuras 7 e 8 - Projeto da Cidade da Pesca apresentado pela prefeitura de São Gonçalo.
|
Fonte: Jornal O DIA, 27/06/2014.
|
- 14 Em 30 de Abril de 2014 foi publicado um decreto da desapropriação de 50 mil metros na praia da Beir (...)
53A Cidade da Pesca seria composta por um Terminal Público Pesqueiro (TPP), um condomínio industrial pesqueiro sustentável, e uma área para o reassentamento para a construção de moradias que posteriormente foi modificado para apenas a indenização. No início do projeto era previsto 800 mil m² para o empreendimento, mas foi desapropriado pelo Estado14 630 mil m².
54O projeto gerou grande perspectiva tanto empresarial quanto dos pescadores e trabalhadores do setor, e foi apresentado como um investimento que colocaria o ERJ em um novo patamar da atividade de pescado. Sendo um empreendimento com investimento público e privado, não faltou empresas que se interessassem na proposta, grandes empresas como a Crusoé Food, o estaleiro Peixaria Pop & Peixe LTDA, a Jealsa-Rianxeira e mais 17 empresas, assinaram um protocolo de intenções com o ERJ.
55Toda a idealização do projeto mostrava uma modificação radical no bairro de Itaóca, e sua dimensão econômica afetaria todo o Estado do Rio de Janeiro, trazendo melhorias urbanas no bairro, criação de emprego e renda, e uma centralidade industrial importante ao Leste Metropolitano.
56A Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (CODIN)15 seria a responsável pelo cadastro de ocupação e avaliação imobiliária assim como pela avaliação das propostas das empresas que estariam interessadas em investir no local.
Figura 9 - Porto de São Gonçalo e Estrada UHOS em Ilha de Itaoca e demarcação do loteamento industrial para a formação da Cidade da Pesca.
Fonte: Elaboração própria com base em imagens do Google Earth, 2018.
57O investimento público no setor de pescado tinha perspectivas regionais, que abarcariam também a cidade de Niterói, complementando mais dois terminais pesqueiros, um no bairro do Barreto próximo à Ilha da Conceição em Niterói principal entreposto do Leste Metropolitano fluminense, e uma requalificação urbana das colônias pesqueiras do Gradim em São Gonçalo. O interesse no aumento da capacidade de processamento do pescado era tanto que se chegou a cogitar também um Terminal Público Pesqueiro na Ilha do Governador, na cidade carioca.
58Em decorrência desse grande projeto, a expectativa de pequenos empresários também foi grande. Para além dos planejamentos da cidade da pesca, a construção das infraestruturas no bairro de Itaóca já era grande, devido a movimentação de trabalhadores que passaram a necessitar de serviços que antes não tinha no lugar. A dinamização foi considerável, vindo a surgir pensões, quartos para alugar e até a construção de um pequeno hotel em frente à praia da Luz.
Figuras 10 e 11- Hotel Vista Linda frente à praia da Beira em Itaoca, São Gonçalo.
|
Fonte: Arquivo pessoal, 2015.
|
59Para além do projeto da Cidade da Pesca que promoveria uma radical mudança econômica na região, a base logística permite associar serviços como de recreação e lazer, projetos de revitalização das orlas, educação ambiental e turismo, um potencial para espaços industriais, como também residenciais e comerciais.
- 16 O CONLESTE é um consórcio entre municípios do LMRJ que são influenciados pelo COMPERJ, e tem em com (...)
60Contudo, a administração local não tem tido presença nesses locais, e as infraestruturas foram sendo depreciados. Tanto o porto quanto a estrada UHOS ficaram abandonadas após o término de uso da Petrobrás e nenhum poder público adquiriu os ativos para promover ações em políticas públicas ou mesmo a preservação. Somado a falta de segurança pública nas comunidades em torno desses ativos, essas bases logísticas se tornaram uso do poder de organizações criminosas. A integração entre os bairros permitida pela construção da estrada UHOS, facilitou a integração entre comunidades já comandada por esses grupos, que ao fim, se tornou um novo circuito interno para o comércio ilícito de narcóticos e armas. Apesar de estar timidamente na pauta de discussões do CONLESTE (Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento do Leste Fluminense)16 e alguns deputados, pouco tem se visto meios práticos para a mudança desse cenário.
61A Cidade da Pesca esteve muito associada ao andamento do COMPERJ, mesmo que entre esses projetos não haja uma relação direta entre suas atividades. Junto com as paralisações do Complexo petroquímico, a Cidade da pesca também passou a ser menos discutida. As ações até então tomadas partiram do Estado do Rio de Janeiro e pouco se tem visto o interesse nas diferentes gestões da prefeitura em dar continuidade nesse projeto.
62Entre os anos de 2006 e 2016, o Estado do Rio de Janeiro passou por intensa reestruturação espacial comandada por uma política pública de desenvolvimento industrial na região. As redes técnicas construídas se tornaram vetores potenciais para atividades industriais, comerciais e de lazer. As potencialidades existentes poderiam valorizar o trabalho pesqueiro com o porto, incentivar atividades industriais/comerciais trazendo uma funcionalidade pública a estrada UHOS, incentivando na conservação ambiental e histórica do local entre outros. Porém, o único projeto apresentado até então foi a Cidade da Pesca que se encontra estagnado.
63Esse projeto tinha grande relevância, e foi idealizado em um período em que grandes projetos de investimento ocorriam por todo o estado do Rio de Janeiro. O projeto que estava em desenvolvimento (pois faltavam alguns estudos sobre os impactos socioeconômicos e ambientais) foi paralisado em meio aos problemas políticos que abalaram a economia fluminense, que chegou a comprometer a continuidades de outros projetos que já estavam em andamento como o COMPERJ e a duplicação da BR493 que estenderia o Arco Metropolitano para Itaboraí.
64Contudo, a refuncionalização das infraestruturas do sistema UHOS ainda mantém o decreto como utilidade pública para a sua refuncionalização, assim como todo o levantamento fundiário.
65Observamos uma grande dificuldade e um desinteresse do poder público local em propor ações para a conservação dos equipamentos e pôr em prática uma gestão compartilhada que traga em questão um planejamento para a situação atual, e que não fique aprisionada as expectativas unicamente com o retorno do COMPERJ ou ações por parte do Estado do Rio de Janeiro e da União. Uma conduta mais ativa por parte do poder público local, e o desfecho das coalizões entre as prefeituras com o CONLESTE poderia se tornar uma grande ferramenta para trazer novos projetos e debates com a comunidade para o melhor uso das infraestruturas. Até então, as ações do poder público local têm se direcionado em reuniões e assembleias gerais entre municípios do consórcio do leste fluminense, mas não tem conseguido pôr em prática uma gestão única para o planejamento da região.
66As estruturas existentes se tratam de grandes projetos de investimento que estão para além dos poderes administrativos do poder público local, o que remete a necessidade de uma gestão compartilhada. Vale ressaltar, que o potencial das redes técnicas existente é de interesse tanto da sociedade quando do empresariado, e a execução de atividade para o desenvolvimento de projetos com base no legado do porto de São Gonçalo e na estrada UHOS, poderia trazer uma nova direção de crescimento econômico e de desenvolvimento social a uma cidade com tensos problemas sociais. O que influenciaria na maior arrecadação tributária diminuindo a dependência por recursos públicos externos.
67Todo o processo de refuncionalização também exige cuidados as interferências, transformação que os grandes empreendimentos acarretam a comunidade e ao próprio município. Até então, o alto grau de investimento privado foi no setor imobiliário, e poucas foram direcionadas em bases produtivas para a diversificação de outras atividades econômicas que gerassem emprego e renda. Os impactos de grandes projetos de investimento exigem uma gestão pública comprometida com o desenvolvimento social para a redução dos problemas que abatem o Leste Metropolitano Fluminense e não fique direcionada aos interesses empresariais, reduzindo o papel administrativo do poder público para um papel empreendedor sem comprometimento com a justiça social.