1Este
artigo é, na integra, resultado de um trabalho maior realizado como
dissertação de mestrado que tratou de um personagem do século XIX, no
caso Thomaz Pompeu de Sousa Brasil, mais conhecido como Senador Pompeu.
Este geógrafo dos oitocentos, que viveu entre os anos de 1818 e 1877,
foi uma destacada figura do Segundo Império e teve seu trabalho
intelectual fortemente vinculado à sua ação política na província do
Ceará e ao contexto nacional daquela monarquia cercada de república por
todos os lados.
2O Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil surgiu como uma preocupação, de início, restrita às atividades letivas que eram desenvolvidas por Pompeu. Lente
de Geografia do Liceu do Ceará desde o começo do funcionamento deste
instituto de ensino, em 1845, Pompeu, na ausência de um manual que
pudesse lhe servir para o exercício de suas lições, resolveu organizar
suas notas de aula de modo que as pôde publicar, em 1851, sob o título
de Elementos de Geographia. Este livro, que mais tarde tornar-se-á um compêndio utilizado para a educação dos poucos letrados de quase todo o Império, foi em sua gênese um livrinho de 284 páginas, que o autor offereceu á mocidade cearense.
3Deste modo, o Compendio
..., surgido em 1856, na realidade é uma continuação deste primeiro
livro, o que por vezes acaba confundindo o pesquisador da obra, posto
que a primeira edição nomeada com o título de Compendio de Geographia, já aparece como uma segunda edição, só que neste caso revista e consideravelmente augmentada, contando agora com 536 páginas e, mais que isso, com um fac-símile da aprovação do IHGB que, em Sessão de 1º de julho de 1853, referendou o “Parecer
do Exm Conselheiro João Duarte Lisboa Serra presidente do Banco do
Brazil, deputado geral, e membro efectivo do Instituto
Histórico-Geografico do Brazil” (BRASIL, 1856:VI), que principiava com as seguintes palavras:
Li
o opusculo do Sr. Thomaz Pompeo de Souza Brazil, presbytero secular e
bacharel formado em sciencias sociaes, e juridicas, ex lente de
Theologia no Seminario d’Olinda, membro honorario do Instituto de
Advogados de Pernambuco, e professor de Geografia e Historia no Lycêo do
Ceará, por elle modestamente intitulado - Elementos de Geographia -,
.... (BRASIL, 1856: VI)
4Esta
edição de 1856 foi feita no Ceará pela Typographia de Paiva e Cia e já
trazia, em sua folha de rosto, a informação de que era “adoptado no Collegio Pedro II, nos Lycêos e Seminarios do Imperio”,
o que indica, de certa forma, a abrangência de sua utilização e a
importância da obra no âmbito do sistema regular de ensino, bem como o
interesse do autor em divulgá-la, adicionada que está na apresentação do
livro a aceitação do mesmo por seus pares authorizados pela sciencia do IHGB.
- 1 O IHGB, bem como IAGP (Instituto Archeologico e Geographico de Pernambuco) e IHGSP (Instituto Histó (...)
5O IHGB, fundado em 1838 e com funcionamento iniciado em 1839, reunia apenas a elite ilustrada e aqueles que podiam efetivamente doar bens
ao Instituto para fazer parte do seleto grupo de “guardiões da história
oficial”. Assim, havia os sócios que pagavam sua entrada e aqueles que,
de algum modo, tinham sua entrada paga, podendo-se dizer de outra
maneira que, aquele grupo que começou com apenas dezessete, não era
somente de intelectuais. A unidade que soldava os homens daquela
associação se materializava nos louros e nos lucros que a mesma auferia,
coincidentemente a maioria deles fazia parte do seleto grupo de deputados, senadores e ministros do Império.1
Criado
logo após a independência política do país, o estabelecimento carioca
cumpria o papel que lhe fora reservado, assim como aos demais institutos
históricos: construir uma história da nação, recriar um passado,
solidificar mitos de fundação, ordenar fatos buscando homogeneidades em
personagens e eventos até então dispersos. Exemplos longínquos dos
centros do Velho Mundo, no Brasil, os institutos se proporão a cumprir
uma tarefa monumental: ‘colligir, methodizar e guardar’ (RIHGB, 1839/I)
documentos, fatos e nomes para finalmente compor uma história nacional
para este vasto país, carente de delimitações não só territoriais.
(SCHWARCZ, 1993:99)
- 2 “..., no 4º ano do curso especial, ao lado do curso de história e geografia do Brasil baseado na Hi (...)
6Além
de sua aprovação pelo IHGB, a obra foi aprovada para uso do Colégio
Pedro II, pelo seu Conselho Diretor e, é claro, chancelado pelo governo,
todavia, sua utilização dar-se-ia apenas na parte referente a Brasil.2
Varios
compendios têm sido publicados pelos professores do Colegio: retorica
pelo Dr. Francisco de Paula Meneses; historia moderna pelo barão de
Tautpheun (professor de grego); e de historia e geografia antiga e media
pelo bacharel João Antonio Gonçalves da Silva. Além destes
publicaram-se, no último ano, diversas obras que foram admitidas pelo
Conselho Diretor e aprovadas pelo governo para uso do Colegio: Epitome
da historia sacra, do Dr. Antonio de Castro Lopes, obra enriquecida de
um dicionario traduzido do latim para o português, com algumas correções
e que foi premiada pelo governo; o
novo sistema para estudar a lingua latina pelo referido doutor; a
gramatica portuguesa, de Cirilo Dilermando; o compendio de aritimética
do major Ávila; o de geografia pelo padre Tomaz Pompeo de Sousa Brasil3; o manual dos estudantes de latim por Antonio Alvares Pereira Coruja. (MOACYR, 3º v, 1938:39/40)
7Uma
das peculiaridades mais interessantes das duas primeiras edições, é que
elas se apoiam sobre um método, conhecido à época como dialogístico. O
método dialogístico consistia em propor que os conceitos fossem vistos
mediante a relação entre o mestre - que dominava o conhecimento, e o discípulo - que deveria aprender, passo a passo, as verdades que o sábio mestre tinha a ensinar.
MESTRE - De que se compoem a parte fisica da terra?
DISCIPULO - De corpos solidos como a terra firme; liquidos como as agoas; e fluidos como os vapores, que formão a atmosphera.
Como está dividida a superficie da terra, e em que proporção?
Em
solida, e liquida: solida a que consta de terra firme; e liquida a que é
occupada pelas agoas: a parte liquida, que consta dos mares, lagos e
rios occupa tres quartas partes da superficie do mundo, e a terra firme
uma quarta parte. (POMPEO (sic), 1856:55-56, apud ROCHA, 1995:143)
8Sobre
a utilização deste método, um amigo pessoal do autor e figura ilustre
entre os intelectuais do Império, Joaquim Manuel de Macedo então
Secretário do IHGB, fará em seu relato na Sessão Pública do dia 15 de
dezembro de 1853 a seguinte observação:
“O
Sr. Dr. Pompeo adoptou no seu Compendio de Geographia o methodo
dialogistico, que se por ventura não tem o merito da originalidade,
recomenda-se ao menos pelos resultados obtidos,...” (BRASIL, 1856:VIII).
9O método dialogístico era também conhecido como o método do Abade Gaultier:
“A
primeira edição do Abade Gaultier apareceu no Brasil em 1838. Desde
então, por mais de quarenta anos reeditou-se e ampliou-se a obra. O
método, de origem jesuítica, consistia em distribuir o conteúdo sob a
forma de um diálogo, entre o mestre e o díscipulo.” (ISLER, 1973:76)
10Deste modo, quando Pompeu lança a terceira edição de seu Compendio..., em 1859, muitas são as alterações que ele adiciona à obra, dentre elas o fim do método dialogístico.
“Atendendo
ao conselho de algumas pessoas illustradas, mudei a forma dialogistica,
que havia adoptado nas duas primeiras edicções, que com quanto se
prestasse mais facilmente á didatica, era menos elegante, e não dava
lugar ao desenvolvimento de outros assuntos.” (BRASIL, 1859:8)
11Além disto, é na terceira edição que o Compêndio assume seu título definitivo: Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil; passa a ser impresso na cidade do Rio de Janeiro, sendo uma das razões o fato de a “segunda edição,..., ter sahido muito defeituosa”
(BRASIL, 1859:5). Ainda assim, na quarta edição Pompeu mudará de
editor, deixará a Casa do Editor Domingos José Gomes Brandão pela Casa
dos Editores Eduardo & Henrique Laemmert, com quem editará o Compêndio...
até sua última edição, em 1869; e adiciona ao rol daqueles que
pesquisou para realização de sua obra, além dos nomes de Malte-Brun,
Giraldez, Gaulthier, Balbi, Volney, Humboldt e Koster, os nomes de
Ganot, Lecoq, Moureau de Jonés e Bouillet.
- 4 Geografia Astronômica, Física e Política, existem enquanto terminologias já desde o século XVII, se (...)
12As
mudança mais significativas, todavia, ocorrem edição após edição, no
concernente às partes que compõem a obra. Na segunda edição, a obra é
ampliada de modo significativo e passa a ser composta por três seções: Cosmografia, Geografia Fisica e Geografia Politica4
(dividida em cinco partes, de acordo com o número de continentes, sendo
a quarta parte a América, na qual se inclui o Brasil com suas
respectivas províncias). Na terceira edição, o Compêndio mantêm
a mesma estrutura, mas deixa de adotar o método dialogístico. Na quarta
edição, desaparecem todas as notas referentes a aprovação do IHGB à
obra, de tal modo que passa a existir
apenas o prefácio do autor, mas a modificação mais substantiva ocorre
em relação à estrutura do livro, que continua tendo três seções, mas não
mais as mesmas, senão vejamos os índices da segunda e quarta edição,
que são, de certa forma, aquelas que revelam efetivamente as
modificações mais substantivas ocorridas no livro:
- 5 A numeração das lições se repete para o caso de França, e Portugal e Hespanha, bem como se repete a (...)
Segunda Edição
Indice
Prologo da Segunda edicção III
Approvação do Instituto VI
Relatorio do Secretario do Instituto VIII
Introducção da primeira XI
Noções Geometricas 4
Parte Primeira
Lição I - Cosmografia 6
Lição II - Dos Astros em geral 10
Lição III - Dos Planetas 15
Lição IV - Da Esphera 26
Lição V - Do Zodiaco e Estações 31
Lição VI - Da Terra 37
Lição VII - Das longitude e latitudes 40
Lição VIII - Das Zonas, sombras, climas 44
Lição IX - Da lua e fases 50
Parte Segunda
Lição X - Geographia Physica 53
Lição XI - Physica - parte liquida 63
Lição XII - Amosphera e Meteorologia 71
Lição XIII - Geographia applicada 84
Lição XIV - Europa Physica 89
Lição XV - Europa Physica 93
Lição XVI - Azia Physica 98
Lição XVII - Azia Physica 104
Lição XVIII - Africa Physica 107
Lição XIX - Africa Physica 112
Lição XX - America Physica 113
Lição XXI - America Physica 120
Lição XXII - America Physica 125
Lição XXIII - Oceania Physica 132
Parte Terceira - Geographia Politica
Lição XXIV - Preliminares 139
Lição XXV - Preliminares 146
Lição XXVI - Preliminares 154
Lição XXVII - Europa Politica 157
Lição XVIII - Suecia e Norwega 163
Lição XXIX - Dinamarca 168
Lição XXX - Russia 171
Lição XXXI - Inglaterra 179
Lição XXXII - Prussia 188
Lição XXXIII - Hollanda e Belgica 193
Lição XXXIV - Allemanha 200
Lição XXXV - Austria 209
Lição XXXVI - Suissa 216
Lição XXXVII - França 220
Lição XXXVII - Portugal e Hespanha5 227
Lição XXXVIII - Turquia 236
Lição XXXIX - Grecia e Ilhas Jonicas 244
Lição XL - Italia 248
Segunda Parte do Mundo
Lição XLI - Azia e sua divisão 261
Lição XLII - Siberia e Caucaso 268
Lição XLIII - China e Japão 270
Lição XLIV - Indostaã 277
Lição XLV - Turquia e Arabia 287
Lição XLVI - Persia e Tartaria 298
Lição XLVII - Belutchistan, Kabul 303
Terceira Parte do Mundo
Lição XXXLVIII - Africa e sua divisão 305
Lição XLIX - Egypto e Berberia 309
Lição XLX - Outros Estados da Africa 314
Quarta Parte do Mundo
Lição L - America 318
Lição LI - America Russa, Dinamarquesa e Inglesa 324
Lição LII - Estados Unidos 329
Lição LIII - Mexico 334
Lição LIV - Antilhas 338
Lição LV - Nova Granada, Venesuela, Equador 341
Lição LVI - Peru e Bolivia 343
Lição LVII - Chile, Paraguay e Uruguay 353
Lição LVIII - Confederação Argentina, Guayna e Patagonia 357
Lição LIX - Brasil - Descoberta, limites e extensão, Serras, 362
Cabos e Portos.
Lição LX - Brasil - ilhas, lagos e rios 367
Lição LXI - Brasil - Affluentes, clima 373
Lição LXII - Brasil - Producções naturaes 375
Lição LXIII - Brasil - População e Industria 384
Lição LXIV - Brasil - Força Publica 388
Lição LXV - Brasil - Religião, Governo e sua divisão eclesiastica 391
Lição LX - Brasil - Divisão Civil, judiciaria e administrativa 397
do Império do Brasil.
Lição LXV - Provincia do Amasonas 399
Lição LXVI - Provincia do Para 403
Lição LXII - Provincia do Maranhão 410
Lição LXVII - Provincia do Piauhy 416
Lição LXIX - Provincia do Ceará 421
Lição LXIX - Provincia do Rio Grande do Norte 431
Lição LXXX - Provincia da Parahiba 436
Lição LXXXI - Provincia de Pernambuco 441
Lição LXXXII - Provincia de Allagoas 449
Lição LXXXIII - Provincia de Sergipe 454
Lição LXXXVI - Provincia da Bahia 458
Lição LXXXVII - Provincia do Espirito Santo 468
Lição LXXXVIII - Provincia do Rio de Janeiro 472
Lição LXXXIX - Corte do Rio 477
Lição XC - Provincia de São Paulo 483
Lição XCI - Provincia do Parana 490
Lição XCII - Provincia de Santa Catharina 494
Lição XCIII - Provincia do Rio Grande do Sul 497
Lição XCIV - Provincia de Minas Geraes 502
Lição XCV - Provincia de Goiaz 509
Lição XCVI - Provincia de Mato Grosso 512
Quinta Parte ou Oceania
Lição XCVII - Estado Social da Oceania 515
QUARTA EDIÇÃO
INDICE DAS MATERIAS CONTIDAS NESTE COMPENDIO
Prefacio á quarta edicção V
PARTE PRIMEIRA
Principio Geraes
Capítulo I Preliminares 1
Capítulo II Cosmographia e definições geraes 2
Capítulo III Principios geraes de geographia astronomica 7
Capitulo IV Astros errantes. Planetas e Cometas 12
Capítulo V Systema solar, movimento diurno e annual 23
da terra e das estações
Capítulo VI Da esphera, circulo, linhas e pontos 28
Capitulo VII Zodiaco, precessão do equinocios e posição 33
da esphera
Capitulo VIII Da terra, sua figura e dimensões 35
Capitulo IX Das longitudes e latitudes 37
Capitulo X Dos habitantes da terra em relação ás suas zonas e 39
sombras; aos seus climas e a longitude e latitude
Capitulo XI Da lua, suas phases e eclipses 43
Principios Geraes da Descripção Physica
Capitulo XII Descripção physica da terra 48
Capitulo XIII Parte liquida do globo 54
Capitulo XIV Atmosphera e meteorologia 59
Capitulo XV O grande continente, divisão do mundo 71
e os oceanos
Capitulo XVI Da sociedade civil, fórmas de governo, leis 74
e industria
Capitulo XVII Da religião e dos diversos cultos do mundo 79
Capitulo XVIII Das raças, linguas, e população do mundo 83
PARTE SEGUNDA
GEOGRAPHIA DESCRIPTIVA
I - EUROPA - GEOGRAPHIA GERAL
Capitulo I Descripção physica 87
Capitulo II Descripção politica 96
Geographia Particular
Capitulo I Da Europa Septentrional e oriental - Russia 102
Capitulo II Da Europa Septentrional - Reino Noruego-Sueco 109
Capitulo III Da Europa Septentrional - Da Dinamarca 113
Capitulo IV Da Europa Septentrional - Inglaterra 116
Capitulo V Da Europa Central - Prussia 123
Capitulo VI Da Europa Central - Holanda 127
Capitulo VII Da Europa Central - Belgica 131
Capitulo VIII Da Europa Central - Allemanha ou Confederação 134
Germanica
Capitulo IX Europa Central - Austria 140
Capitulo X Europa Central - Suissa ou Confederação 145
Helvetica
Capitulo XI Europa Central - França 148
Capitulo XII Europa Meridional - Hespanha 153
Capitulo XIII Europa Meridional - Portugal 158
Capitulo XIV Europa Meridional - Italia 161
Capitulo XV Europa Meridional - Estados Italianos 166
Capitulo XVI Europa Oriental - Grecia e Ilhas Jonicas 173
Capitulo XVII Europa Oriental - Turquia e Principados 177
Danubianos
Quadro Estatístico do Estado Soberanos da Europa 185
II - ASIA - GEOGRAPHIA GERAL
Capitulo I Descripção Physica 187
Capitulo II Descripção Politica 194
Geographia Particular
Capitulo I Da Asia Septentrional e Meridional - Russia 201
Asiatica (Siberia e Caucaso)
Capitulo II Da Asia Occidental - Turquia Asiatica 203
Capitulo III Da Asia Ocidental - Arabia 211
Capitulo IV Da Asia Meridional - Persia, Kaboul, 212
Belout-chiston e Herat
Capitulo V Da Asia Meridional - Indostao e Indo-China 216
Capitulo VI Da Asia Oriental - Divisão Politica das Indias 220
I - India independente 220
II- India Colonial ou Estado Europêos 221
III - India-China ou além do Ganges 224
Capitulo VII Da Asia Oriental - China e paizes sujeitos 225
Capitulo VIII - Da Asia Oriental - Japão 230
Capitulo IX - Da Asia Central - Tartaria ou Turquestam 232
independente
III - AFRICA - GEOGRAPHIA GERAL
Capitulo I Descripção Physica 235
Capitulo II Descripção Politica 241
Geographia Particular
Capitulo I Da região do Nilo - I. Abyxinia (Ethiopia 246
dos Anyigos); II. Paiz do Bahr-el-Abiad;
III. Nubia; IV. Egypto
Capitulo II Da região de Magheb, Marrocos, Argel, 253
Tripoli e Tunis
Capitulo III Da região austral e oriental 257
Capitulo IV Região da Negricia e Africa Colonial 260
IV - AMERICA - GEOGRAPHIA GERAL
Capitulo I Descripção physica 271
Capitulo II Descripção politica 285
Quadro Estatistico dos Estados e possessões da América 290
Geographia Particular
Capitulo I Da America Septentrional - America Russa, 292
dinamarqueza e inglesa
Capitulo II Da America Septentrional - Estados Unidos 297
Capitulo III Da America Septentrional - Mexico 304
Capitulo IV Da America Septentrional - America Central ou 308
as cinco Republicas
Capitulo V Das Antilhas e Guyanas - Hayti, Cuba, Porto Rico, 310
Jamaica e Martinica
Capitulo VI Da America Meridional - Columbia ou as 316
Republicas de Nova Granada, Equador,
Venezuela e Panama
Capitulo VII Da America Meridional - Peru e Bolivia 321
Capitulo VIII Da America Meridional - Paraguay, 326
La Plata e Uruguay
Capitulo IX Da America Meridional - Chile e America Indigena 333
V - OCEANIA - GEOGRAFIA GERAL
Capitulo I Descripção physica 337
Capitulo II Descripção politica 340
PARTE TERCEIRA
IMPERIO DO BRASIL
AMERICA MERIDIONAL
Capitulo I Fundação, posição, dimensões, limites, clima e 345
salubridade
Capitulo II Serras, cabos, ilhas, portos e lagos 348
Capitulo III Rios e affluentes 351
Capitulo IV Producções naturaes, mineralogia, phictologia 357
e zoologia
Capitulo V Industria agricola, manufatora e commercial 361
Capitulo VI Governo, organização politica, população e 365
religião
Capitulo VII Organisação administrativa, finanças, forças, 369
correio e instrucção publica
Capitulo VIII Divisão eclesiatica, judiciaria e civil 374
Quadro das Provincias com sua superficie e população 377
Capitulo IX Provincia do Amazonas 378
Capitulo X Provincia do Para 382
Capitulo XI Provincia do Maranhão 389
Capitulo XII Provincia do Piauhy 397
Capitulo XIII Provincia do Ceara 403
Capitulo XIV Provincia do Rio Grande do Norte 412
Capitulo XV Provincia Parahyba 417
Capitulo XVI Provincia de Pernambuco 422
Capitulo XVII Provincia de Alagôas 435
Capitulo XVIII Provincia de Sergipe 440
Capitulo XIX Provincia da Bahia 446
Capitulo XX Provincia do Espirito Santo 456
Capitulo XXI Provincia do Rio de Janeiro 461
Capitulo XXII Municipio da Côrte 472
Capitulo XXIII Provincia de São Paulo 476
Capitulo XXIV Provincia do Parana 483
Capitulo XXV Provincia de Santa Catharina 488
Capitulo XXVI Provincia de São Pedro do Rio Grande do Sul 493
Capitulo XVII Provincia de Minas Geraes 500
Capitulo XVIII Provincia de Goyaz 509
Capitulo XXIX Provincia de Matto-Grosso 515
13O
que se percebe, então, comparando os índices, é a mudança na estrutura:
1) não mais por lições, mas agora por capítulos; 2) passando a ter um
preâmbulo que dividia a Geografia em Geral e Particular, e dentro desta
divisão continuava a descrever physica e politicamente:
continentes, países e províncias, como nas edições anteriores; 3) com o
Brasil passando a ter um trato isolado e finalizador, e não envolto na
parte referente à América, como acontecera até a terceira edição.
14Uma das coisas mais interessantes na obra são os títulos
de Pompeu, que aparecem edição após edição, na folha de rosto do livro.
Deste modo, na terceira edição, de 1859, que é aquela que apresenta a
maior quantidade de titulações, aparece a seguinte lista de títulos:
Bacharel
formado em sciencias sociaes e juridicas pela Academia de Olinda,
Vigario Geral foraneo da Provincia do Ceará, Professor de Geographia no
Lyceo da mesma Provincia, socio correspondente do Instituto Historico e
Geographico do Brasil, da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional,
da Sociedade Amante da Instrucção da Côrte, socio honorario da Sociedade
Philomatica da Côrte, do Atheneo Paulistano, do Instituto de Advogados
de Pernambuco, do Instituto litterario, e da Associação Typographica do
Maranhão.
15Enquanto isso, na quinta e última edição do Compendio, em 1869, aparece a menor lista de títulos, todavia a que mais o qualifica no tocante ao reconhecimento scientifico institucional da época:
Sócio do Instituto Historico e Geographico do Brasil, da Sociedade Geographica de Paris, etc, etc...
- 6 “Las Sociedades Geográficas son difíciles de definir por ser muy heterogéneas en carácter desde su (...)
16A
redução curricular demonstra a importância do autor, que agora já não
necessita mais elencar sua participação na Sociedade Amante da
Instrucção da Côrte porque faz parte da primeira sociedade geográfica
fundada no mundo, a Sociedade Geographica de Paris, de 18216, e isto basta para revelar suas qualidades intelectuais.
17Em todas as edicções, cinco ao todo: 1851, 1856, 1859, 1864 e 1869; o Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil faz um offerecimento, coisa comum aos homens do clube imperial, ao Defensor Perpétuo do Império: O Imperador D. Pedro II.
18O
historiador José Honório Rodrigues afirma, na apresentação do seu
Índice Anotado da Revista do Instituto do Ceará, que Pompeu “foi um
precursor dos estudos demográficos, ecológicos e estatísticos no Brasil.
Se sua obra geográfica, a única da época, nada acrescenta à de Aires de
Casal, suas pesquisas sôbre a população e sôbre o clima e as sêcas
cearenses avultam pela seriedade, segurança e originalidade.”
(RODRIGUES, 1959:19/20). O que José Honório considera como geográfico,
no caso, é o Compendio..., a única das obras de Pompeu que efetivamente
trazia no título a nomenclatura da disciplina.
- 7 Joaquim Manuel de Macedo foi responsável pelo necrologio de Pompeu, em Sessão solene do IHGB, em 18 (...)
19Por sua vez, um amigo íntimo que costumava pedir atas e gabriolas7
a Pompeu, o famoso Joaquim Manuel de Macedo - Secretário (1852-1856) e
Orador Efetivo (1857-1881) do IHGB, romancista, geógrafo e historiador
-, em 1873 “afirmava de Aires de Casal, no prólogo às suas Noções de Corografia que era o ‘mestre e o guia de quantos tem escrito depois dele’. ” (PRADO JR, 1980:176/7)
20O
autor de A Moreninha conhecia bem o Compendio do amigo, tendo chegado,
inclusive, a fazer um relato do manual didático na Sessão Pública de 15
de dezembro de 1853 do IHGB. O que nos leva a crer, segundo as
declarações de 1873, que também o Compendio seguia as orientações da
Corografia do mestre Casal.
21Bernardo
Isler, em seu trabalho seminal sobre o ensino de geografia no Brasil,
falará do “compêndio didático mais difundido no Império Brasileiro”
(ISLER, 1973:42) como um livro que “oferece disparates”, tais como:
pag 93 - ‘Todos os rios da Europa despejão nos mares que a banhão...’
pag 104 - ‘A Russia hoje é uma grande, civilizada e poderosa nação que ...’ (BRASIL apud ISLER, 1973:42)
22Isler dirá ainda que o manual didático se contradiz quando, por exemplo, em outro momento, Pompeu passa a afirmar que “a Russia é um dos paízes mais atrazados em civilização na Europa:...” (BRASIL apud ISLER, 1973:42), mas sua crítica é demolidora quando, após algumas referências do tipo: “Imperio
da China - Carater físico e moral, civilização - são pequenos,
amarelos, cabeça de forma conica e figura triangular e geralmente feios;...” (BRASIL apud ISLER, 1973:43), diz que isto
É
o retorno à literatura fantástica medieval, com o sabor das aventuras
de Marco Polo. O autor de imaginação fértil e desinibida, estava
oferecendo como Geografia, um produto que, já em sua época, era
inaceitável: os exageros e disparates apresentados na obra não são
encontrados nem mesmo nos mais exagerados cronistas de alguns séculos
antes. (ISLER, 1973:43)
23Já na parte do Compendio
referente ao Brasil, que era a parte efetivamente utilizada no Colégio
Pedro II, Isler fará a mesma observação que vimos até então, ou seja, a
de que Pompeu seguira fielmente, “com algumas alterações”, o mesmo
conteúdo e estrutura do Corografia Brasílica.
24Em estudo recente, 1996, sobre a Trajetória da Disciplina de Geografia no Currículo Escolar Brasileiro (1837-1942), Genylton Rocha, seguindo o mesmo raciocínio de Isler, afirma, ao analisar o manual escolar de Pompeu:
Diga-se
de passagem que apesar de ser um compêndio de Geografia do Brasil, boa
parte da obra se dedica aos estudos generalistas sobre diferentes países
do globo. No que diz respeito a parte referente ao Brasil, o autor se
baseia na obra de Aires de Casal, a Corographia Brasílica, limitando-se a
transcrever informações nela contidas, realizando, entretanto, algumas
leves modificações, ou eliminando dados que por conta da desatualização,
não poderiam continuar sendo mantidos. Como na obra que lhe inspirou,
este compêndio se prestou a veicular uma geografia meramente descritiva,
sem preocupação nenhuma com a análise científica dos fenômenos
abordados. (ROCHA, 1996:147)
25O Compendio,
olhado com os olhos do nosso tempo, pode ser visto como apenas uma
cópia, em alguns casos como uma falácia fantasiosa baseada em fábula de
lugares não visitados. Todavia, colocado na moldura do seu tempo, um
manual escolar com funções definidas dentro de uma longa tradição, deve
ser revisto como uma série de práticas dentro das quais o mesmo se
inscreve.
26O
equivoco recorrente de conceber mudanças por rupturas drásticas, tem
levado alguns pesquisadores a não compreender que práticas e concepções
atuais foram forjadas no alto medievo. As mentalidades, e os valores que
as mesmas engendram, não mudam da noite para o dia, por vezes se
adaptam aos novos tempos como um produto do passado rearranjado para o
presente.
27O Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil
aparenta ser, à luz do nosso cotidiano, uma cópia. Todavia, àquela
época, os documentos eram compilados e recompilados e a referência aos
autores raramente aparecia.
28A
cópia, também era, dentro da tradição aristotélica da imitação, reposta
pela teologia de Tomás de Aquino, uma arte. Representar com perfeição a
realidade, e imitar com perfeição a imitação primeira, era prática
corrente ainda durante o século XIX, principalmente entre aqueles
ligados à Igreja Católica e seus dogmas, o que é o caso de Pompeu, que
chegou, inclusive, a ser professor de teologia dogmática no Seminário de
Olinda. Logo, copiar não era um pecado capital, posto que chegava a
ser, para alguns, uma virtude.
- 8 “A parte humana da Corografia é a mais ampla. (...). No terreno próprio da geografia humana traz-no (...)
29Este fenômeno é perfeitamente exemplificável pela obra escrita por Aires de Casal. A Corografia Brasílica é considerada, em muitas de suas partes, uma cópia da cópia, como no caso dos textos referentes à zoologia, na seção sobre os povos indígenas.8
Caio Prado Jr., em seu estudo sobre a obra de Casal, revela que as
fontes eram quase todas relatos encontrados na Biblioteca Real trazida
de Portugal, com cerca de 60.000 volumes, a maioria deles escritos de
viajantes como Gandavo ou de pessoas ligadas à administração, e que
estas mesmas fontes eram dificilmente citadas, o que dificultou, por
vezes, a descoberta dos escritos originais. “Na parte geográfica é muito parco em notícias bibliográficas. Quase não cita suas fontes, e é difícil reconstitui-las.” (PRADO JR., 1980: 172)
30A Corografia Brasílica se inscreve, como parte do Compêndio de Geographia -
apesar de uma separação de mais de cinco décadas entre as duas obras -,
dentro de uma tradição que é da cópia de textos, às vezes, até
anônimos, que eram reconhecidos como verdadeiros, ou escritos por
pessoas que tinham dentro da Boa Sociedade, antecedentes honrados. A obra de Aires de Casal se inscreve, ela mesma, dentro desta prática da época.
A
nomenclatura, a simples enumeração, a descrição puramente formal e sem
espírito crítico, a falta absoluta de um critério verdadeiramente
científico, ...; tudo isto que constitui a característica essencial da
Corografia Brasílica, continuará viciando os estudos de geografia no
Brasil. Neste sentido, e graças a seu prestígio que ninguém ousaria
contestar, o livro de Casal retardará consideravelmente a renovação,
entre nós, dos métodos geográficos. Raros serão aqueles que se afastarão
do modelo consagrado. (PRADO JR., 1980:177)
- 9 CAPEL, em seu trabalho sobre a “Institucionalización de la Geografia y Estrategias de la Comunidad (...)
- 10 “O sucesso da Corografia no estrangeiro se manteria por muito tempo. É com certeza nela, ou em seus (...)
31Um outro exemplo desta tradição é a obra de Adriano Balbi,9 Tratado de Geographia Universal, Physica, Historica e Politica., que teve sua primeira edição em 1838. Pelo índice, podemos perceber que é praticamente o mesmo do Compendio,
com algumas poucas modificações na parte de Brasil, que, por sua vez,
é, em boa dose, uma imitação da obra de Aires de Casal, que era
largamente copiada nos manuais de geografia feitos na Europa.10
32O
que há de originalidade, está nas transformações que a tradição vai
sofrendo, de uma cópia para outra. Não há, de modo mecânico, uma quebra
brusca, uma ruptura imediata. Tal fenômeno é perceptível na mudança
gradativa que vão sofrendo as idéias. Adriano Balbi, que teve o seu
modelo copiado por Pompeu, já copiara para sua obra o esquema da
divisão política dos povos. Tal divisão considerava os povos como sendo selvagens, bárbaros ou civilizados,
acompanhando uma tradição fundada no século XVII, herdada na transição
entre a baixa idade média e a ascensão da sociedade moderna e
solidificada em algumas teorias da História do final do século XVIII e
início do século XIX.. Por outro lado, a dupla tradição corográfico-matemática, expressa na divisão do Compêndio nas suas três partes: astronómica, physica e política,
aparece explicita em quase todos os compêndios dos oitocentos e se
estende, de certo modo, até os dias de hoje, mas se funda no trânsito
histórico entre o medievo e a modernidade.
La
posibilidad de una geografia general de las sociedades humanas empezó a
vislumbrarse en el siglo XVII. En los manuales de geografia de esa
centuria empezó a usarse la expresión geografía política o civil, que
algunos autores, como por ejemplo Guillaume Sanson de Abbeville incluían
dentro de la geografia histórica. En la segunda edición de su
Introduction à la Géographie (1690) aparece ya una división tripartita
de la geografia que los autores repetiríam una y otra vez; geografía
astronómica, “que explica la correpondencia del Globo Terrestre con la
Esfera”; geografía natural, “que das las divisiones de todas las partes
de la Tierra y el Agua”; y geografía histórica, “que considera la Tierra
por los Estados Soberanos, por la extensión de las Religiones, por la
extensión de las Principales Lenguas, por las diferentes Especies y
Razas de Hombres, por sus Colores, y por la Forma exterior del Cuerpo”.
Con algunas pequeñas variantes en la terminología (astronómica, física y
política) ésta fue la división que se usaría ampliamente durante el
siglo XVIII y que perduraría luego todavía largo tiempo em los manuales
escolares.
En esta geografía política o civil se incluía muchas veces
la descripción corográfica de países y regiones, con los rasgos
principales de los diferentes pueblos. Pero otros autores la
consideraron como una parte de la geografía general y se dedicaron en
ellas a reflexiones - generalmente breves - sobre las razas y sus
variedades, la población y su distribución, la adaptación a los diversos
climas, la religión, las formas de gobierno, las características de los
pueblos salvajes, bárbaros y civilizados, o los rasgos básicos de la
actividad comercial. Éstos son, por ejemplo, los temas que aparecen en
las Lecciones de Geografía Astronómica, Natural y Política (1804-1806),
escrita por el gran geógrafo español Isidoro de Antillón.
(CAPEL,1989:10/11)
33Posto desta forma, o Compendio
é uma continuidade da tradição no concernente ao modelo, o que há nele
de novo não é apenas aquilo que aparece de noticioso, também, neste
caso, uma cópia dos relatórios dos presidentes de província sobre as
estatísticas das unidades administrativas do País. Pompeu cita suas
fontes em muitas partes do Compendio, dando uma larga demonstração de ter ido até elas, como no caso em que discute os volcões e terremotos.
(4)
Os volcões e terremotos são os dous phenomenos da natureza que mais
assombrão o homem. Suas causas não são ainda demonstradas; os sabios tem
cogitado varios systemas, que se fundão mais em hypotheses do que em
realidade.
Humboldt, Beaumont, Lecoq e outros são da opinião que elles procedem do calor central, e gazes comprimidos no interior da terra.
Uma
só causa, o augmento gradual do calor terrestre, desde a superficie até
o centro nos explicará de uma vez a causa dos tremores de terra, dos
levantamentos successivos dos continentes das cadêas de montanhas, das
erupções volvenicas, e das formações das rochas, ou de metaes. (Cosmos,
Tom. I, pag. 187).
Perguntar, diz em outra parte, o que arde nos
volcões, o que gera o calor, funde os metaes e as rochas, e produz
corrente de lava de grande espessura, cuja temperatura é ainda muito
elevada, muitos anos depois da sahida da cratéra, é prejulgar a questão.
A
nova geognosia prefere procurar a causa no calor central do nosso
globo, calor cuja existência se revela á superficie pela temperatura
crescente rapidamente, com a pronfudidade debaixo de todas as latitudes,
e cuja origem remonta a essas épocas cosmogonicas, em que nosso planeta
foi formado por condensação progressiva de uma parte da atmosphera
neblosa do sol. (Cosmos, Tom. I, pag. 187)
Arago publicou em 1824 no
Annuario do Bureau de long uma lista de volccoes ardentes no mundo que
chegava a 163. O continuador de Malte-Brun em 1832 affirmava que existem
sobre a terra 518 volcões activos ou sulfataros, sendo 14 na Europa,
100 na Asia, 31 na África, 207 na America, 171 na occeania. Girardin, em
uma obra mais recente, publicou uma taboa de volcões do globo e dá 24 á
Europa, 11 a Africa, 14 á America e 108 a Occeania. (Vide Lecoq,
Géologie, p.271) (BRASIL, 1869: 57-58)
34Voltando
a Bernardo Isler, que chegou a dizer que “a parte relativa ao Brasil
obedece ao trabalho de Aires de Casal, fonte onde o autor buscou seu
conteúdo, tanto na distribuição dos títulos como na infomação oferecida.
Sem resumir, Thomaz Pompeo limitou-se a transcrever, com leves
alterações, os tópicos colhidos na Corografia, os que mais se adaptavam à
sua obra.” (ISLER, 1973:43-44). Concordamos, em parte, posto que o
modelo estava sendo adaptado para um manual escolar, ao mesmo tempo, que
seguia uma tradição. Todavia, Pompeu não faz apenas cópia, chegando,
inclusive, a corrigir equívocos de Aires de Casal, como aquele referente
à situação geográfica da Província do Rio Grande do Norte em relação ao
Rio de Janeiro.
Situação - Fica entre 4º 2’ e 6º 15’ de latitude meridional, e 5º 45’ e 8º 15’ de long. oriental do Rio de Janeiro (1)
_________________
(1) Ayres de Casal dá 4º 10’ e 5º e 40’ de latitude, o que é visivelmente errado. (BRASIL, 1869:422)
- 11 “..., acreditamos, pois, que os ‘caminhos e descaminhos’ percorridos pela geografia escolar brasile (...)
35A
Geografia dos manuais escolares, produto dos relatórios dos homens que
exerciam o poder, nos seus respectivos Estados-nacionais, era a
Geografia destes limites territoriais. A compilação era, portanto, uma
conduta universal, que transformava em documentos os dados fornecidos
pelos viajantes, capitães-mores, presidentes de província ou membros das
sociedades geográficas. No caso de Pompeu nos parece que se manteve em
parte esta tradição seletiva11, que continuou ainda por todo o dezenove, copiando o modelo dos compêndios franceses e da Corografia Brasílica,
porém as fontes - ainda que de segunda mão - são citadas e as teses
sobre muitos temas, discutidos sob a ótica de vários autores.
36Por isso, é fácil analisar um compêndio de geografia dos dezenove considerando-o cópia, trabalho descritivo, imaginação fantasiosa com fortes cores medievais.
Apesar de ser um pouco disso tudo que disseram, o compêndio de Pompeu
não é apenas isto. Parece-nos que a questão fundamental é saber qual a
importância para a formação de uma identidade nacional daquela
geografia, que o IHGB e a Direção do Colégio Pedro II aprovaram, e da
qual iam beber os poucos jovens da elite letrada deste país, por longos
anos.
37Um manual escolar com funções bem definidas, o Compendio...,
até o presente momento, só foi analisado pelo seu conteúdo
explicitamente descritivo, pelo seu caráter disparatado e fantasioso,
por ser uma continuação com leves modificações (ISLER, 1973; ROCHA, 1996) da Corografia Brasílica de Aires de Casal, na sua parte referente ao Império do Brasil.
38Os críticos da obra de Pompeu parecem ter esquecido alguns detalhes de importância significativa. Inicialmente, o Compendio...
não foi escrito para fazer nenhuma revolução epistemológica; seu papel
era, desde o início, muito claro, servir à mocidade cearense e depois à
juventude brasileira que freqüentava a escola. Segundo, quem freqüentava
os bancos escolares eram homens, brancos, livres e que possuiam bens,
portanto, a elite que iria fazer parte daquela ilha de letrados no meio do imenso mar de analfabetos.
Terceiro, se assim não o fosse, aquele manual didático não teria sido
aprovado pela Direção do Colégio Pedro II e muito menos o seria pelo
IHGB, que costumava ter pareceristas muito rígidos para quem fugisse aos
interesses daquele instituto, preocupado em construir a nação. (VLACH,
1988)
39O “compêndio didático mais difundido no Império Brasileiro” (ISLER, 1973, 42) deve ter tido uma certa importância, que não era meramente scientifica,
mas parece-nos tinha um forte viés político. A Geografia que as elites
deveriam aprender, e foi a que aprenderam ou memorizaram, durante muitas décadas dos oitocentos, era aquela que, colada aos currículos, formava aquela pleiade de homens bons que, em último caso, em um país de negros escravos, mestiços sem posses e índios selvagens, eram os únicos brasileiros que dos lados de cá efetivamente havia. “Por que a cultura cívica era tão circunscrita, tão fechada? Porque no Império a democracia era a democracia dos senhores” (FERNANDES, 1987:17). Posto que “a nação eram eles. Aquele pequeno nós coletivo, que era o mesmo praticamente de Norte a Sul.” (FERNANDES, 1987:18).
40Uma breve comparação entre os currículos de geografia do império e o índice do Compendio
..., deixa claro que eram as duas faces daquela mesma escola de
inspiração francesa, que tinha por princípio criar uma idéia acerca da
nação e pari passu, disseminá-la entre os cidadãos.
41Bem,
se no Brasil eram poucos os cidadãos, como aquela Geografia que as
elites formularam, chegou aos ouvidos dos demais catequisados que não
eram sequer brasileiros? Há que se pensar em outras vias de transmissão
do conhecimento entre
os muitos que permaneciam analfabetos; de como pensaram ou foram
forçados a pensar aquele imenso império destinado a ser o centro do
mundo civilizado.
Segundo
as estatísticas citadas por Lourenço Filho a situação do ensino, ao fim
do Império, era a seguinte: as escolas primárias, em número de 15561,
reuniam, em 1878, 175 mil alunos. No município da Corte havia 211
escolas (das quais 95 públicas e 116 particulares) com 12 mil alunos. Se
a população do Município Neutro era calculada em cerca de 400 mil
habitantes (dos quais 70 mil escravos), os alunos constituiam apenas 5%
da população livre. Em todo o país contava-se cerca de nove milhões de
habitantes da população livre - logo, os alunos representavam apenas 2%
da população. Aliás, o recenseamento de 1870 registrava um índice de
analfabetos de 78% nos grupos de população, nas idades de 15 anos e
mais. (WEREBE, 1985:382)
42Deste modo, a pergunta que se coloca para nós, por enquanto, não é saber se o Compendio
... era cópia ou não do modelo de Casal; se ainda estava apegado à
Geografia como nomenclatura ou se, por ventura, já havia sofrido uma
influência da modernização da ciência geográfica. A questão parece ser a
de situar o manual didático dentro do currículo que as elites letradas
haviam delineado e para o qual aquele livro escolar deveria estar
adequado.
43Comparando o índice do Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil,
com os currículos aprovados no Colégio Pedro II - currículos que
serviriam de modelo para os demais Liceus do Império -, vemos que se
complementam diante das necessidades que tinham.
- 12 “O regulamento de 31 de janeiro de 1838 introduziu, a exemplo dos colégios franceses, os estudos si (...)
- 13 “Por ‘tradição inventada’ entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras táci (...)
44Quando o Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil é adotado no Colégio Pedro II, em decorrência de mudanças na legislação, isto é também uma cópia da França de Guizot e Falloux12. É a tradição inventada13 o que faz Pompeu, porque a serviço do Estado é o que a mocidade brasileira precisa aprender.
Como
conseqüência da legislação de 1854, seria baixado em 24 de janeiro de
1856 um novo decreto, com a finalidade de fixar programas e indicar os
compêndios a serem adotados nos dois cursos em que naquele momento
estavam divididos os estudos no Colégio (estudos da primeira classe e
estudos da segunda classe). Euzebio de Queiroz chegou mesmo a afirmar
que os programas adotados pelo Colégio [Pedro II] haviam sido adaptados
dos últimos programas prescritos para os liceus nacionais da França,
tendo sido realizados apenas as necessárias modificações e alterações.
(ROCHA, 1996:141)
45A
civilização nos oitocentos, mesmo para a Europa era, antes de mais
nada, a França, com seu idioma unificador, com suas instituições
civilizadas, com suas luzes. Porque “Paris é, sem dúvida alguma, a
capital do mundo, o centro civilizador por excelência, onde tudo é
ruído, movimento e espetáculo.” (GOMES, 1996:56)
46A
elite imperial, sequiosa por transformar essa jovem nação em um Império
civilizado, pretendeu fazer do Brasil uma Europa mais ao sul, afrancesando-a, posto que, segundo os vaticinios de Milliet de Saint-Adolphe, em seu Dicionário geográfico, histórico e descritivo do Império do Brasil de 1845, “...,
este vasto continente,..., parece que havia sido predestinado pela
Providência para ser o centro das transações comerciais de todo o mundo
civilizado ” (SAINT-ADOLPHE apud MATTOS, 1993:9).
47Se esta predestinação geográfica para a civilização não podia ser desconsiderada, era necessário um pouco mais, para metamorfosear este vasto território em uma “nação civilizada européia nos trópicos” (OLIVEIRA, 1990:52), posto que aqui, além da canícula terreal e dos muitos espaços vazios, havia a mistura das raças e a ignorância dos povos.
48A
escola, para os poucos que nela puderam ingressar, foi a possibilidade
de criar uma elite extremamente ciosa de sua condição européia, branca,
ilustrada. Habituada a vestir-se no calor tropical como se estivesse no
mais rigoroso inverno e a estudar muito mais os alpes franceses que o
solo brasileiro.
49Somente ainda não éramos, mas seríamos, sabe-se quando, civilizados.
50Este fenômeno se fez perceber em nossa filosofia oficial
durante os quase três quartos iniciais do século XIX, o espiritualismo
eclético cousiano, que só haveria de ser suplantado pelo positivismo,
essa filosofia que fizera surgir aquele bando de idéias novas
dos anos setenta dos oitocentos. Assim, por dentro da estrutura da
igreja e seus seminários, formou-se toda uma plêiade de homens que cria
profundamente nos postulados filosóficos de Victor Cousin.
É
do século XIX, porém, que data, no Brasil, uma atividade filosófica
permanente e sistemática e em que novas influências da França se fazem
sentir. O primeiro representante delas foi Frei Francisco de Mont’Alvern
(1784-1858), afamado pregador. No Compêndio de Filosofia do frade (que é
aliás, a sua única obra no gênero, composta por volta de 1833 e
impressa somente em 1859, após sua morte), encontramos o eco da
filosofia dos ecléticos, sobretudo das idéias de Victor Cousin. (COSTA,
1987:325).
51E
além de Mont’Alverne muitos foram seguidores do ecletismo como
paradigma filosófico, quase todos saídos do âmago dos dogmas católicos
do espiritualismo, formados que haviam sido para o enciclopedismo
ilustrado. Dentre eles Gonçalves de Magalhães, Eduardo Ferreira França,
José Maria de Moraes Vale e Antonio Pedro de Figueiredo, este último
apelidado, à sua época, de Cousin Fusco.
Todos eles, por dentro dos seminários ou ainda por intermédio de
instituições de ensino secundário como o Colégio Pedro II e Ginásio
Pernambucano, participaram de modo efetivo na formação de muitos dos
homens letrados da elite nacional do Império. Daí, porque seguindo um “estilo Luis Felipe”
(COSTA, 1987:327), produto da retomada conservadora francesa, “o
ecletismo na sua ambigüidade, apresentava uma solução para a classe que
detinha o poder, para os ideais de nossa achinelada aristocracia” (COSTA, 1987:327), ou seja, manter tudo aquilo que, a todo instante, ela parecia estar a mudar.
52Francês,
portanto, era o modo de pensar das elites imperiais. Franceses seus
vocábulos para muito do que se queria dizer. Francesas suas instituições
intelectuais, a exemplo do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e
dos Liceus, da disciplina urbana imposta pelas ruas largas em sua
disposição quadriculada. Ainda que inglesas suas máquinas e suas
dívidas. Franceses os currículos, as normas escolares, a maioria dos
livros. Francesa, vejam só, também era a Geografia que se deveria
aprender.
É
francês o programa, são franceses os textos e compêndios de quase todas
as matérias, inclusive o Manuel de Baccalauret e o Atlas Delamanche, em
uso nos liceus parisienses em total desacordo com situações elementares
da vida brasileira. (CHIZZOTTI apud ROCHA, 1996:140)
53Os
estudiosos que se debruçam sobre o ensino no Império, são unânimes em
afirmar o caráter francês de nossas instituições de ensino, com seu
humanismo ilustrado, voltado para uma compreensão enciclopédica de
mundo. Dentre eles poderiamos citar alguns como HAIDAR (1972), ROCHA
(1996), MOACYR (1937). Nas palavras de um desses estudiosos “foi
preciso buscar no estrangeiro a experiência que nos faltava; a atração
irresistível que então exercicíam sobre nós as idéias, as instituições e
os costumes franceses, impôs-no o modelo francês.” (HAIDAR, 1972:99)
54Esta idéia aparece com todas as letras no Compendio..., quando se trata de demonstrar a importância do modelo francês.
Importancia
e civilisação - A França occupa hoje o primeiro lugar entre as grandes
potencias de primeira ordem. O que lhe dá essa alta importancia é,
geographicamente fallando, sua feliz posição no centro do continente, a
homogeneidade de seu povo: politicamente a sua historia, que a apresenta
como primeiro povo guerreiro e civilisado do mundo, sua alta
civilisação, sua industria, o seu caracter, governo, suas leis e
instituições. A França marcha á frente da civilisação do mundo, que ella
domina pelo seu genio, pela litteratura e sciencia de seus sabios
eminentes em todos os ramos de conhecimentos humanos. Uma universidade
com 17 academias departamentaes, compostas de 30 faculdades de
theologia, direito, medicina, mathematicas e bellas-artes, como immensos
outros estabelecimentos litterarios diffundem a instrucção por todas as
classes. (BRASIL, 1869:187)
55E
é claro, exemplo do que deveria ser a educação secundária para os
poucos que liam à época do Império, foi criado em 1838, à moda francesa,
o Colégio [de] Pedro II, em homenagem ao futuro ilustrado monarca. A
intenção dos dirigentes imperiais naquele momento, em que se transladava
para os trópicos o estudo dos alpes setentrionais, era a idéia de um sistema nacional de ensino, que tinha por finalidade conseguir o mesmo que fora conseguido pela França.
A
unidade nacional, que o interesse crescente pelos meios de comunicação
prometia fortalecer, exigia também, na opinião de muitos, a
uniformização do ensino em todo país. Nas Cartas ao Amigo Ausente,
expressivos retratos da euforia progressista da década de [18]50,
testemunhava Paranhos: ‘Todos reconhecem que a instrução carece de
centro e carece de unidade para que possa, como convém, tomar caráter de
uma instituição nacional. É a instrução comum, a identidade de hábitos
intelectuais e morais que se adquire nas escolas que, no parecer do
ilustrado Sr. Cousin, constituem a unidade e a nacionalidade’. (HAIDAR,
1972:27)
56A
Pompeu cabia, ao que nos parece, escrever um Compêndio à moda dos
manuais franceses, que lido pelos brancos de um país majoritariamente
não branco, tinha por finalidade formar alguns poucos senhores para
falar a todos o que se conceberia, às custas do exercício do favor ou da
chibata, em verdade na boca das elites e daquele povinho mais ou menos miúdo que habitava este imenso e verde país.
57Posto desta forma, é no mínimo exemplar a primeira citação que se encontra no Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil, e que abrindo o manual demonstra a concepção em que se embasara o autor.
Dai-me
a carta de um paiz, sua configuração, seu clima, suas agoas, seus
ventos e toda sua geographia physica; informai-me de suas producções
naturaes, de sua flora, de sua zoologia, etc., e eu, me comprometo a
dizer-vos a priori qual será o homem desse paiz e que lugar gozará na
historia; não accidental, mas necessariamente; não em tal época, mas em
todas; enfim a idéa que este paiz é chamado a representar. (COUSIN,
Cours de Philosophie Apud BRASIL, epígrafe do Compendio)
58Se
a idéia era criar por intermédio do ensino a unidade da nação, por que
as elites afastaram da escola a expressiva maioria dos habitantes deste
vasto território, que era, em muitos lugares, vazio? Pois bem, centro da
polêmica que ROCHA (1996) estabelece com VLACH (1988), esta questão
deixa evidente uma importante e fulcral contradição.
59A contradição, no caso, diz respeito ao acesso à escola no Brasil, que ainda nos dias atuais é dificílima às classes-que-vivem-do-trabalho
(ANTUNES, 1991). Ora, se a maioria não chegava aos bancos escolares no
império, como podería ser a escola a responsável pela criação desta
pretendida unidade nacional, por intermédio da difusão de uma ideologia
patriótica (VLACH, 1988)? Era preciso que a maioria não soubesse ler,
para que uma minoria, que a quase tudo controlava, dissesse, porque foi à
escola, o que era certo e errado, o que era ser brasileiro e quem não
seria brasileiro de modo algum. A nosso ver a escola formou a elite que
deveria ensinar aos demais o que os demais deveriam poder aprender.
- 14 “Estamos diante de uma sociedade [escravista] onde a produção e apropriação do trabalho excedente n (...)
60É
claro que, dentro dessa estrutura que forjava uma identidade pela
exclusão (FRANCO, 1979), pouquíssimos agregados talentosos - os “primos
pobres” da elite senhorial -, podiam ainda ascender. Todavia aos
escravos restava apenas o efetivo uso da força, posto que, a violência,
sempre foi a mediação social que esteve no cerne das próprias relações
escravistas de trabalho14.
61Logo,
a escola foi fundamental para a divulgação dessa ideologia patriótica
da unidade nacional, porém insuficiente, posto que a nosso ver, foram
necessárias outras instituições e práticas sociais, a maioria delas
baseada no mandarinato dos senhores de terra, no ofício dos padres e no
controle estatal feito pelos bacharéis. Quando tudo isto falhava, então
funcionava a Guarda Nacional criada à moda francesa, que enfim, conseguia estabelecer seu pacífico consenso.
62Os estudiosos da História do Pensamento Geográfico, são unânimes em afirmar que a geografia escolar é anterior a institucionalização da Geografia
Moderna. Dentre eles poderíamos citar CAPEL (1977); ESCOLAR (1996);
PALACIOS (1992); LACOSTE (1985). A esta afirmação, segue-se uma outra,
que vincula a geografia escolar ao sistema nacional de ensino, que teria
como finalidade precípua a criação de uma ideologia patriótica.
63Partindo
desse pressuposto, de que a geografia escolar precedeu à geografia
acadêmica e aos geógrafos, poder-se-ia até mesmo dizer, que em sua
acepção moderna houve antes professores de geografia e só depois destes é
que apareceram os geógrafos. E mais até, que sua institucionalização
enquanto ciência ocorreu por dentro da escola secundária.
..La
geografía tuvo el privilegio de ser una de las ciencias favorecidas por
la fuerte demanda de professores que generó el movimiento de
escolarización antes señalado. Para formar esos profesores la geografía
se institucionalizó en la universidad. Y asi nació la comunidad
científica de los geógrafos, para enseñar geografía a los que habían de
enseñar geografia. (CAPEL, 1977:20)
64Todavia,
o que faria uma disciplina, que sequer houvera ainda se
institucionalizado, aparecer como componente de praticamente todos os
currículos surgidos com o advento dos modernos sistemas nacionais de
ensino? Ou pensando de outro modo, o que faria essa disciplina de tardia
institucionalização, aparecer colada ao fenômeno da escola pública que
tinha, por desiderativo, educar a todos para o bem comum?
E ainda mais, porque exatamente a geografia, se havia uma série de
outras disciplinas sociais de maior tradição e reconhecimento acadêmico?
Las
razones por las que la geografia seguió figurando en los programas, a
pesar de la directa amenaza de otras ciencias que no consiguieron
introducirse en la ensinanza básica (piénsesse en la fisiografía o la
ecologia, y en las ciencias sociales como la economía o, más tarde, la
sociologia, ciencias todas de fuerte desarrollo y gran prestigio)
constituyen en realidad una cuestión a resolver.
Entre
estas razones que explican el triunfo de la geografía sobre las
disciplinas rivales se encuentra, sin duda, una de gran importancia: la
función asignada a la geografía en la conformación del sentimiento de
nacionalidad. (CAPEL, 1977:18)
65Então,
ao que parece, o papel da geografia surgida com os sistemas nacionais
de ensino, era o de consolidar um modelo próprio da modernidade: o
Estado-Nação. E o Estado-nação conformou-se a partir de um
“pré-requisito necessário para a conformação material de qualquer
Estado-Nação moderno [que] corresponde exatamente à apropriação
exclusiva de um território onde montar, a posteriori, o processo de integração social ...” (ESCOLAR, 1996:103)
66Em
outras palavras, antes que houvesse aquela comunidade que iria se
assumir como pertencente a um dado território, era necessário que
existisse um território, sendo que o cimento dessa base material
territorializada era essa comunidade identificada com o Estado-Nação.
Nos
dias de Mazzini, pouco importava para os italianos se o Risorgimento
tinha existido, de modo que, como Massimo d’Azeglio admitiu em sua
famosa frase, ‘Nós fizemos a Itália, agora temos que fazer italianos’.
Não importava nem mesmo para aqueles que, preocupados com a ‘questão
polonesa’, sabiam provavelmente que os camponeses polacos (para não
citar o terço da população do antigo Rzescpopolita pré-1722 que falava
outros idiomas) não se sentiam ainda como poloneses nacionalistas, como
reconheceu o libertador da Polônia, coronel Pilsudski, em sua frase, ‘É o
Estado que faz a nação e não a nação que faz o Estado. (HOBSBAWM, 1991:
56)
67Afirmar
aqui que a geografia incluída nos currículos dos sistemas nacionais de
ensino, impressa nos manuais didáticos oficiais, teve papel
preponderante na criação deste forte sentimento de pertencimento
territorial, é o mesmo que repetir o que dezenas de estudiosos no
assunto já disseram, guardadas as características peculiares da
conformação material (territorial) e ideológica (sentimento de
pertencimento) de cada Estado-nação.
68Agora
se enveredássemos por outro viés, quiçá pudessemos pensar que o modelo
Estatal-nacional, era fundamental, principalmente, àqueles que o
criaram, que o disseminaram, que dele se utilizaram para mundializar
relações, em que, o exercício da alteridade nacional, era fundamental às
relações desiguais e combinadas do capitalismo.
Primeiramente
a estruturação capitalista tem lugar em padrões nacionais
territorialmente precisos e isso tende a constituir um mundo
nacionalizado, isto é, formado por unidades Nacional-estatais soberanas,
sobre as quais se produzem, e com base nas quais se ordenam as relações
de dominação político-econômicas burguesas internacionais e
intranacionais. (ESCOLAR, 1996:109)
69Por
essa senda, seria possível analisar o caso da geografia escolar
brasileira dos oitocentos com outro olhar, para além da discussão
interna, referente à formação ou não de uma ideologia patriótica por
intermédio do falho sistema nacional de ensino do Império. Ou seja, qual
a importância, nesta estrutura mundial nacionalizada, de uma forte
consciência nacional que abarcasse todas as classes e gentes num país de
capitalismo dependente e tardio como o Brasil? E à elite nacional,
sócia-minoritária desse sistema mundializado, qual a importância de
educar os homens livres pobres, bem como os escravos, para o exercício
do pertencimento territorial?
os
brasileiros responsáveis pelo destino do Império não deveriam ser
confundidos com os escravos, que não eram cidadãos. E muito menos com
aqueles outros homens que, embora livres, não eram proprietários de
escravos, porque os mesmos ainda que fossem cidadãos não eram cidadãos
ativos. (GONÇALVES e MATTOS,1991:16)
70No
caso do Brasil, antiga colônia portuguesa, país de capitalismo tardio,
parece-nos que era preciso soldar o território indispensável às
barganhas feitas pela elite nacional em âmbito mundial e, pari passu,
manter o pequeno círculo dessa elite cidadã, brasileira e nacionalista,
logo excludente, dentro do mesmo processo que a fazia parte do mundo,
desejosa de civilização, francesa nos trópicos, uma ilha de letrados em meio ao mar de analfabetos.
71Em
outras palavras, se houvesse mais brasileiros do que havia, seria
preciso, mesmo que ainda de modo muito desigual, dividir o que para as
elites desse país sempre foi atômico, indivisível, mesmo com os modernos
progressos da física quântica. Seria preciso durante o Império, romper,
dentro do mundo, o papel que cabia a esta jovem nação do futuro no
teatro do capitalismo mundial: a monocultura de exportação baseada no
trabalho escravo e no latifúndio. Posto que
O
mesmo movimento que gerava a desintegração do Antigo Sistema Colonial
alterava as posições hierárquicas no sistema mundial de Estados, com a
instalação da hegemonia da Inglaterra, a emergência dos Estados Unidos e
os sucessivos redesenhos do mapa da Europa continental - a construção
do Império Napoleônico e sua posterior desagregação. A forma como as
nações latino-americanas iriam inserir-se ao novo contexto mundial
estaria balizada no plano internacional em várias dimensões. No plano
econômico, marcado pela hegemonia do industrialismo inglês, a extinção
dos monopólios coloniais implicaria na pressão pela adoção do
livre-cambismo e em um novo tipo de inserção das economias
latino-americanas na divisão internacional do trabalho: como
exportadoras de matérias-primas e alimentos. O novo padrão tinha sobre o
processo de construção do Estado um efeito paradoxal: reiterar a
heteronomia econômica que mantinha essas economias como tributárias de
centro capitalista passava a ser uma condição de sua soberania política,
ou seja, a viabilidade dos novos Estados estava intimamente ligada à
existência de produtos exportáveis que os mantivessem no fluxo do
sistema econômico mundial e que possibilitasse às elites dos novos
Estados se sobreporem às pulsões centrífugas de uma base social
rarefeita e não integrada economicamente em nível nacional. (COSTA,
1996:151-2)
72A nação,
para a qual Pompeu escreveu o seu Compêndio, era aquele pequenino
círculo que podia votar porque tinha renda, ou seja, os cidadãos ativos,
e a geografia neste caso seria indispensável, por dentro da escola,
para criar uma série de representações, as ideologias geográficas. Porque
As
ideologias geográficas alimentam tanto as concepções que regem as
políticas territoriais dos Estados, quanto à autoconsciência que os
diferentes grupos sociais constroem a respeito do seu espaço e da sua
relação com ele. São a substância das representações coletivas acerca
dos lugares, que impulsionam sua transformação ou o acomodamento nele.
(MORAES, 1991:44)
73E dentre as ideologias geográficas
criadas pelos intelectuais da elite, poderíamos citar: 1) o forte
sentimento de unidade territorial que justificou muitas das ações
centralizadoras do Estado Imperial e sua violência pacificadora;
2) A grandiosidade territorial do espaço geográfico brasileiro, de onde
derivaria aquela idéia de potência, calcada em uma perspectiva
expansionista a nível de América do Sul; 3) O privilégio ontológico de sua localização, que situava, no centro do mundo civilizado,
aquele Império cercado de república por todos os lados e 4) A idéia de
um país em construção que, apesar de ainda não fazer parte dos países
civilizados, um dia haveria de fazê-lo, posto ser ainda uma jovem nação,
logo, de próspero futuro.
74As
duas dimensões do caráter Estatal brasileiro, quais sejam: a
peculiaridade de sua construção interna, se comparado aos demais Estados
latino-americanos; e a sua inserção em um mundo de paradigma
Estatal-nacional, como ex-colônia. Estão colocadas ao longo do Compendio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil, uma das grandes contribuições do geógrafo orgânico que Pompeu soube ser, à sua época, para a sua classe, na elaboração dos signos da nação,
já que em países como o Brasil “as representações espaciais forneceram
um elemento de referência negado pela história, colocando a discussão
geográfica no centro do debate ideológico.” (MORAES, 1991:166)
75O Compendio
..., como pudemos ver, inscrevia-se dentro de uma tradição
epistemológica que era o da mera descrição, enumeração dos fenômenos,
repetição de modelos comuns à geografia clássica. Tanto é que
[o]
‘Compêndio de Geografia’, de que se tiraram cinco edições, foi objeto
de elogios do Cardeal de Wiseman, de Londres, e outros sábios, sem
embargo da observação de Pompeu Sobrinho de que, apesar de o ilustre
geógrafo [Pompeu] já conhecer as principais obras de Humboldt, os seus
trabalhos são moldados, segundo o sistema universalmente adotado
(BARROSO, 1977:206)
76Logo, a análise que fizemos da obra, procura considerar, fundamentalmente, a concepção que tinha o seu autor no concernente à sciencia geographica
e o modo como trabalhou, sob os vários aspectos da formação do
Estado-nação brasileiro, por nós considerados, as representações deste
Estado-nação.
77A começar pela discussão sobre sciencia, Pompeu dirá que
A
Geographia sendo a descripção da terra em geral, e de suas divisões
políticas em particular, não é uma sciencia estacionaria; porque todos
os dias o horizonte dos conhecimentos humanos se dilata, fazem-se novas
descobertas; e novas conquistas vêm enriquecer o thesouro que a sciencia
accumula de geração em geração.
Não só o mundo physico soffre
alterações como quasi sempre as circumscripções politicas se modificão,
ora por annexões, ora por separações, e conquistas. A sciencia tem pois a
obrigação de acompanhar esse movimento, se quizer exprimir fielmente o
estado actual do mundo, ou dos paizes que descreve. (BRASIL, Prefácio à
Quinta Edição, 1869)
78A
Geografia seria então a ciência preocupada em descrever os aspectos
físicos da terra e ao mesmo tempo abordaria a divisão política de modo
particular. A descrição dos aspectos físicos subsidiaria a compreensão
da divisão territorial dos Estados nacionais. O interessante nessa
concepção scientifica, no entanto, diz respeito à visão de uma dinâmica natural, cultural e política de que há um continuum de tranformações ocorrendo, que o mundo não está parado nem física, nem politicamente. A sciencia tem pois a obrigação de acompanhar esse movimento,...
O espírito dessa idéia é fundamental a um país como o Brasil, ainda em
processo de conformação de fronteiras que se movimentam para oeste,
ainda sem identidade definida, ainda em construção.
A
Geographia socorre-se de varias sciencias accessorias para preencher o
seu fim; mas nem por tomar a Cosmogonia, a Astronomia, a Geologia, a
Physica, a Historia natural, a Estatistica e a Economia Politica certos
princípios geraes, deve invadir o dominio dessas sciencias; porque seria
um abuso que desnaturaria o seu fim. (BRASIL, Prefácio, 1869)
79As
ciências acessórias revelam a necessidade de dar à ciência geográfica
uma objetividade científica que, à época, repousava sobre as ciências
ligadas diretamente à natureza da nova sociedade. É partindo dessa
concepção que, na seção que trata das definições das ciências, assim
será definida a Geographia:
Geographia que é a descripção da superficie da terra em suas diversas relações.
A
terra pode ser considerada, ou como astro (planeta) em relação com os
demais corpos celestes, ou como um corpo physico, e seres physicos que a
povoão: ou como um corpo politico ou moral em relação a sociedade
civil, isto é, o genero humano.
D’aqui vem dividir-se a Geographia em matemática, Physica e Politica. (BRASIL, 1869:5)
80Esta
perspectiva é idêntica àquela adotada na Argentina para a mesma
finalidade de criar, por intermédio da escola, uma nação soldada sobre
um território, delimitado a partir das fórmulas no campo da matemática e
da física, bases da nova linguagem scientifica moderna.
La
inclusión de la Geografía representaba, efectivamente, um sintoma de
modernidad dentro de un contexto donde todavia dominaba la cultura
eclesiástica en los ámbitos universitários del Rio de la Plata; pero ¿En
qué consistía este carácter ‘moderno’? No es ésta, evidentemente, la
Geografía que pretende un estudio comprensivo de las relaciones
existentes entre el hombre y su medio natural. En sus aspectos
complementarios, no pretendia ir más allá de la clásica revisión
enciclopédica sobre la diversidad de gentes, costumbres, paisajes y
maravillas del mundo moderno. Su principal interés, sin embargo,
derivaba de su participación como ‘ramo de las matemáticas’ en el
desarrollo y práctica de las Ciencias Náuticas; en este sentido, se
hallaba totalmente ligada con la aritimética, la geometría, la
trigonometría, la cosmografía, la hidrografía, y también el dibujo y la
mecánica, y en cambio se encontraba todavía bastante alejada de la
etnografía, le economía y la política. (PALACIOS, 1992: 76-7)
81A ordenação dos assuntos no Compêndio
é muito clara quanto as suas pretensões. A partir do cosmos, da
ordenação do mundo, de uma cosmovisão baseada na física newtoniana e na
lógica formal matemática, temos o universo como uma criação que funciona
de modo mecânico, perfeito e divino. Logo, profundamente hirarquizado.
82É
importante não esquecer a idéia de um Deus criador de tudo, mantenedor
de uma certa ordem e ao mesmo tempo presente nos processos que regem o
mundo. É assim que veremos, na primeira parte da obra, uma preleção dos
conhecimentos acessórios,
que são essenciais à compreensão da máquina. É como se tivéssemos
diversas engrenagens teóricas da realidade, esta também um conjunto de
peças acionadas para um mesmo fim, ou seja, cumpriria ver nas sciencias accessorias
a justificativa natural para a natureza de um mundo baseado em leis
mecânicas. Analisando as concepções acerca do sistema solar, Pompeu faz o
seguinte comentário sobre o modelo apresentado por Descartes:
Systema de Descartes
- Este philosopho, nascido em 1596, tentou explicar os movimentos dos
corpos celestes, considerando-os como collocados no centro de turbilhões
de uma materia subtil. Os turbilhões dos planetas arrastão os
satellites, e o turbilhão do sol por sua vez arrasta os planetas com
seus turbilhões e seus satellites. Se o systema de Descartes foi
regeitado pelas dificuldades numerosas que apresenta, ao menos deve-se
agradecer a seu illustre autor ter pela primeira vêz feito applicação
das leis mecanicas ao movimento dos corpos celestes. (BRASIL, 1869:26-7)
83A
intenção da explicação desses fenômenos seria a de fazer crer que todas
as coisas no mundo tinham uma mesma origem, já que “o sistema
cartesiano foi o primeiro grande modelo de ruptura. A natureza passa a
ser um sistema racional de leis matemáticas estabelecidas por um Deus
racional” (GOMES, 1996:71) . Em outras palavras, a existência de países,
fronteiras, Estados nacionais, se justificaria pela ordem cósmica, se
tudo funcionava como o universo em sua acepção mecânica, por que não
funcionaria o planeta Terra do mesmo modo?
84A partir do geral, de modo objetivo, com sciencia reconhecidamente aceita como tal, se desenha o Universo; dentro dele, a Terra; nela, os continentes; nos continentes, os países; dentre os países, o Brasil; no interior do Brasil, suas províncias.
85Assim se divide o Compêndio em três partes:
A primeira contém 18 capítulos, e trata das noções geraes, que a Geographia pede ás sciencias accessorias.
Esta parte é dos Principios Geraes.
A
segunda que é descriptiva, divide-se em cinco grandes secções
correspondentes ás cinco grandes partes do mundo. Cada secção
subdivide-se em Geographia geral, e particular.
A Geographia geral
compõe-se de dous capitulos; um que descreve a parte physica, e outro a
politica em cada uma das secções. Estes capitulos se subdividem em
tantos artigos quanto os objetos nelles classificados, como posição,
dimensão, limites, etc.
A Geographia particular consta de tantos
capitulos, quanto são os paizes, que descreve, e estes capitulos de
tantos artigos, quanto os objetos de que trata.
A terceira parte é
destinada á Geographia especial e do Brasil, que comquanto devesse ser
incluido na ordem em que se escrevem os outros paizes da America,
comtudo como nesta parte nos afastamos das proporções do compendio para
maior desenvolvimento, preferimos trata-la em separada formando uma
parte distincta por sua extensão. (BRASIL, Prefácio - vj-vij, 1869)
86A
arrumação dos conteúdos nesta ordem revela uma ordenação lógica,
baseada em uma cosmovisão que dá aos Estados nacionais caracteres
individualizantes. Dentre estes caracteres, o território, o solo natal,
se coloca como fundamento de nossa gênese e telos.
“Assim, entre os acidentes geográficos da superfície da Terra,
destacam-se as fronteiras, e estas qualificam povos, cujo caráter vai
sendo moldado num ininterrupto intercâmbio com seus torrões natais.”
(MORAES, 1991, 167)
87Poderíamos
associar diversos critérios no processo de criação e consubstanciação
das nações modernas, tais como: língua, etnia, religião, cultura, dentre
outros, mas não poderíamos deixar de caracterizar o Estado nacional
moderno, como um Estado baseado na existência de um território
delimitado e uma nação criada à sua imagem e semelhança a partir “[do] discurso geográfico [que] foi, sem dúvida, um elemento central
na consolidação do sentimento de pátria. Pode-se mesmo dizer que esse
seria o principal núcleo divulgador da idéia de identidade pelo espaço.”
(MORAES, 1991:166).
88Ao
longo das páginas o desenho que se esboçará tem como intuito propor uma
nação baseada na civilização européia. O modelo, dentre os países
europeus, mais exemplar, será, como já vimos, a França.
89O
modelo de civilização atende a alguns requisitos fundamentais: 1)
Religião, que estipula uma série de normas éticas e morais, deve ser
cristã e de preferência católica; 2) A língua deve oficialmente ser
apenas uma e polida; 3) As condições materiais devem ser scientificamente aproveitadas
pelo bom labor, idéia de que a sociedade é tanto mais civilizada quanto
possa se disciplinar para o trabalho; 4) O conjunto de normas e leis
que regem a nação, por intermédio do Estado, tem por finalidade ordenar o
trato civilizado entre os habitantes de um país, sendo a escola e a
instrução um dos principais meios de tornar civilizados os habitantes de
um país.
Estado ou Paiz (que
politicamente é o mesmo). - É uma grande extensão de terra occupada por
uma nação, dividida em várias regiões, que se distinguem por alguma
circumstancia physica, historica ou politica.
Nação - Quanto a seu estudo moral pode ser:
Selvagem
- A que ignora a arte de escrever, não tem policia, professa uma
religião absurda, cultiva principalmente os exercícios do corpo, isto é,
a pesca, caça, pastoria, etc, e só pugna pela liberdade natural, como
os povos d’Africa Central, da Oceania; ou os indígenas da America.
Barbara
- A que sabe a arte de escrever, tem policia, magistrados, allianças e
comercios com as nações civilizadas; mas não tem sua lingua polida, nem
sua legislação bem ordenada; não cultiva as sciencias e a artes
liberais, e é amiga da guerra, taes são algumas nações Asiáticas e quasi
todas as Africanas.
Civilisada
- A que tem a lingua polida, sua legislação bem concebida e ordenada;
seu governo activo e previdente; sua policia ilustrada e vigilante,
sciencias e artes em estima, allianças reguladas por uma politica
illustrada: taes são as nações da Europa e da America civilisada. (BRASIL, 1869:80-81)
90E
como Pompeu tratou a Monarquia, que no discurso das elites imperiais
era fundamental à manutenção da unidade territorial? Liberal brasileiro
que era, denominou-a de Governo Mixto, que segundo sua acepção se caracteriza “...quando
as partes potenciaes do summo poder se achão repartidas por differentes
sujeitos physicos, ou moraes, de maneira que nelas se combinão as
formas primitivas, por exemplo, o governo do Brasil, e de quasi todas as
nações civilisadas.” (BRASIL, 1869:83).
91As concepções que fluem Compêndio
adentro, como se a obra fosse um caudaloso rio de idéias da época,
demonstram a argúcia de um projeto que tinha, como linha mestra, a
construção de um Estado forte e centralizado. Um Estado que fosse capaz
de intervir em todas as esferas do fazer social, determinando regras as
mais diversas, dando homogeneidade ideológica a nação, fazendo com que o
País se encaminhasse rumo à civilidade.
92O Compêndio de Geografia Geral e Especial do Brasil,
é uma obra que revela o modo como a nação foi pensada. Enquanto homem
de uma elite, a seu tempo e com o instrumental geográfico, Pompeu
escreveu com suas mãos o que a classe de que fazia parte pensava.
Podemos resumir o enorme livro didático dizendo que ele é a fotografia
de como o Estado brasileiro - nos olhos iluminados dos bons senhores -
pensava em constituir a nação com a cara da Europa, mas especificamente
com rosto francês .
93Consolidando a idéia de construção, a fábula bem contada de que esta jovem nação um dia seria civilizada.
O
Brasil ainda é novo para a civilisação, mas não atrasado pelo que
respeita aos talentos e meios de adquirir instrucção.”(BRASIL, 1869:473)